“Mas, uma vez que certos espíritos frenéticos excitaram graves perturbações na Igreja em nosso tempo por causa do pedobatismo, mesmo agora não deixam de produzir tumultos, nada posso fazer senão adicionar aqui um apêndice com o fim de coibir-lhes as fúrias...” (João Calvino)
Pois bem, parece que não foi somente nos tempos de Calvino que pessoas tem se levantado contra o verdadeiro entendimento dos sinais da aliança dada por Deus como estatuto perpétuo a Abraão e posteriormente a Moisés. E que permanecerão essencialmente e eternamente através do Novo testamento.
Tentarei fazer um breve resumo desta tão vasta doutrina, interligada a tantas e tantas outras, para que de uma forma bem simples possa ser entendida até pelos mais indoutos.
Não vou me ater ao período anterior a Abraão, até porque quanto mais extenso o texto, menos pessoas o lerão. E aqui começa nossa odisseia dentro do pacto da graça e seus símbolos em distintas dispensações.
Aprouve a Deus chamar um Homem, chamado Abrão e fazer com ele um Pacto, que serviria para ele e toda sua posteridade como estatuto perpétuo:
“... e falou Deus com ele, dizendo: Quanto a mim, eis a minha aliança contigo: serás o pai de muitas nações; E não se chamará mais o teu nome Abrão, mas Abraão será o teu nome; porque por pai de muitas nações te tenho posto; E te farei frutificar grandissimamente, e de ti farei nações, e reis sairão de ti; E estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência depois de ti em suas gerações, por aliança perpétua, para te ser a ti por Deus, e à tua descendência depois de ti. E te darei a ti e à tua descendência depois de ti, a terra de tuas peregrinações, toda a terra de Canaã em perpétua possessão e ser-lhes-ei o seu Deus. Disse mais Deus a Abraão: Tu, porém, guardarás a minha aliança, tu, e a tua descendência depois de ti, nas suas gerações. Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós, e a tua descendência depois de ti: Que todo o homem entre vós será circuncidado. E circuncidareis a carne do vosso prepúcio; e isto será por sinal da aliança entre mim e vós.” (Gênesis 17:3-11)
Antes de discorrer sobre tal doutrina, é importante que eu já abra um parêntese para dizer que, da mesma maneira como o povo da circuncisão (os judeus) no antigo pacto eram conhecidos como Filhos de Abraão por manterem a aliança dada ao seu Pai, assim também no Novo Pacto (não Novo no sentido de algo realmente iniciado do nada, mas no sentido de renovação, do grego kainós), Deus enxertou aos Filhos de Abraão os gentios, e deu a eles o direito de serem feitos coerdeiros da aliança filhos do novo pacto: “Sabei, pois, que os que são da fé são filhos de Abraão.” (Gálatas 3:7).
Logo, confiados em Deus e nas Escrituras, podemos dizer que somos filhos de Abraão tão quanto os Judeus no Antigo Pacto o eram.
Sabendo agora que pertencemos ao mesmo pacto que Abraão foi chamado, devemos manter-se cumprindo dentro desse RENOVADO Pacto os sinais de nossa Aliança com Deus, a saber, o Batismo que aponta exatamente para as mesmas coisas que a Circuncisão apontava no seio da antiga aliança.
Sabemos que o conceito de Sacramento, segundo nossa Teologia Reformada é: “Os sacramentos são santos sinais e selos do pacto da graça, imediatamente instituídos por Deus para representar Cristo e os seus benefícios e confirmar o nosso interesse nele, bem como para fazer uma diferença visível entre os que pertencem à Igreja e o resto do mundo, e solenemente obrigá-los ao serviço de Deus em Cristo, segundo a sua palavra.” (CFW)
O Reformador John Knox sabiamente escreveu:
Assim como os patriarcas sob a Lei, além da realidade dos sacrifícios, tinham dois sacramentos principais, isto é, a circuncisão e a páscoa, e aqueles que os desprezavam e negligenciavam não eram contados entre o povo de Deus, assim nós também reconhecemos e confessamos que agora, na era do Evangelho, só temos dois sacramentos principais, instituídos por Cristo e ordenados para uso de todos os que desejam ser considerados membros de seu corpo, isto é, o Batismo e a Ceia ou Mesa do Senhor, também chamada popularmente Comunhão do seu Corpo e do seu Sangue.
John Knox afirma sabiamente o que claramente é visto na Escritura, que ambos os sacramentos, de forma comparativa, tanto a Circuncisão quanto a Pascoa apontam exatamente para as mesmas coisas que o Batismo e a Santa Ceia. Duas Grandes Ordenanças de Deus ao Povo, tanto do antigo pacto, como no Novo Pacto.
Um dos Pilares da chamada Teologia do Pacto, é que pertencemos a mesma Igreja do Antigo Testamento, e que em ambos os momentos estamos sob a Graça de Deus. Outra coisa é que no Pacto Renovado (Novo - kainós), permaneceu toda a essência do antigo, sem, no entanto, permanecer as formas, isso se da no culto, nos sacramentos e em outros aspectos.
Apesar da Renovação ter mudado a forma visível dos dois grandes sinais do antigo pacto, como eu já disse, os significados continuam os mesmos... (me aterei apenas a questão do Batismo).
Muitos alegam que a Circuncisão no Novo testamento não aponta para o Batismo, pois a circuncisão do crente é dentro do coração, mas esquecem de que a verdadeira circuncisão do Judeu dentro do antigo pacto também era dentro do coração.
Moises disse: “Tão-somente o SENHOR se agradou de teus pais para os amar; e a vós, descendência deles, escolheu, depois deles, de todos os povos como neste dia se vê. Circuncidai, pois, o prepúcio do vosso coração, e não mais endureçais a vossa cerviz.” (Deuteronômio 10:15-16).
É justamente isso que o Apostolo Paulo fala em Romanos: “Mas é Judeu o que o é no interior, e circuncisão a que é do coração, no espírito, não na letra” (Romanos 2:29).
Paulo (assim como Moisés) fala que a verdadeira circuncisão acontece no coração do Judeu. Isso indica que mesmo no tempo em que o sinal visível era a circuncisão na carne do prepúcio, ela não passava de um meio de Graça que indicava um sinal externo de uma graça interna. Assim como o Batismo aponta um sinal externo de uma graça interna, porque verdadeiramente é batizado quem o é interiormente, aquele que foi lavado pelo sangue, mortificado com Cristo e purificado de seus pecados.
Por isso o Apostolo Paulo é categórico em afirmar que nós, gentios, estamos também circuncidados porque fomos sepultados com Cristo pelo Batismo: “No qual também estais circuncidados com a circuncisão não feita por mão no despojo do corpo dos pecados da carne, a circuncisão de Cristo; Sepultados com ele no batismo, nele também ressuscitastes pela fé no poder de Deus, que o ressuscitou dentre os mortos.” (Colossenses 2:11-12)
Mas isso gera a grande dúvida, mas se eles apontam para isso, não é necessário ter fé para participar? E as crianças? Porque as Batizamos então?
Oras, porque como disse bem Calvino:
“Quando o Senhor manda Abraão observar a circuncisão [Gn 17.1-10], ele prefacia que será o Deus dele e de sua semente, acrescentando que nele estavam a afluência e a suficiência de todas as coisas, para que Abraão tivesse consciência de que sua mão haveria de ser-lhe a fonte de todo bem.”
E diz mais...
“Os filhos dos judeus, sendo também feitos herdeiros desse pacto, uma vez que se distinguiam dos filhos dos ímpios eram chamados semente santa [Es 9.2; Is 6.13]; pela mesma razão, ainda agora, os filhos dos cristãos são considerados santos, ainda que nascidos só de um genitor fiel; e, segundo o testemunho do Apóstolo [1Co 1.14], eles diferem da semente imunda dos idólatras.
Ora, quando o Senhor, imediatamente após ser firmado o pacto com Abraão, preceituou que nas crianças fosse assinalado um sacramento exterior [Gn 17.12], que justificativa, pois, podem os cristãos alegar para não atestarem e selarem hoje também em seus filhos?
O pacto é comum; comum é a razão de confirmá-lo. Só o modo de confirmar é diverso, porque àqueles era a circuncisão, a qual foi substituída pelo batismo. porque o sinal de Deus, comunicado à criança como um selo impresso, confirma a promessa dada ao pai piedoso e declara ter sido ratificado que o Senhor há de ser por Deus não só a ele, mas também à sua semente; nem quer que sua bondade e graça sejam acompanhadas não só por ele, mas ainda por sua posteridade até a milésima geração [Ex 20.6; Dt 5.19]. No qual primeiramente brilha a bondade de Deus para glorificar e enaltecer seu nome; e, segundo, para consolar ao homem fiel e dar-lhe maior ânimo para entregar-se totalmente a Deus, ao ver que não só se preocupa com ele, mas também com seus filhos e sua posteridade.”
Com isso não há desculpa para a ausência dos filhos dos crentes no Batismo, pois são igualmente santos, como os filhos dos judeus eram santos, no antigo pacto.
Se deveras afirmamos que pertencemos à descendência de Abraão e que fomos incluídos a esse pacto, que somos corpo de Cristo e membros da mesma Igreja, negar todas essas verdades bíblicas é jogar todo o antigo pacto numa dispensação morta que pra nada serve a não ser o que foi escrito diretamente sobre as paginas do Novo testamento.
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Autor: Atila Calumby
Fonte: Mensagem Reformada
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