Por Roger Smalling
Todas as forças naturais e todas as circunstâncias da nossa vida são controladas por nossa língua![2] Quando falamos positivamente, uma grande força espiritual gera-se dentro de nós, e esta muda ao mundo que nos rodeia.[3] As situações mais difíceis podem ser mudadas por nossa língua. Se prosperam os malvados, é porque nós os cristãos temos declarado que seja assim. Inclusive a salvação das almas depende da nossa confissão positiva. Ao não crer, poderíamos estar jogando uma maldição a alguém, se declaramos que esse alguém está a ponto de escorregar e, quando o faz, seria o resultado de nossa maldição, mas não profecia.[4]
Tais anunciações são mediante representativos das doutrinas da Palavra de Fé[5], sobre a confissão com nossa boca. Ainda que pareçam tremendamente extremas, ainda há mais; por exemplo, Charles Capps atribuiu o nascimento virginal de Cristo a uma declaração positiva de Maria. Ela recebeu a palavra do anjo em seu espírito e logo esta se manifestou em seu ventre.[6]
Tanto Copeland como Capps nos dizem que Satanás nos programou insidiosamente para que, desde jovens, falemos palavras perversas e de morte. Devemos eliminá-las de nosso vocabulário já que “elas colocam em movimento a chama ardente das forças espirituais negativas”.
Quais são estas palavras tão horrorosas que Satanás nos ensinou a pronunciar? Por exemplo: “Morro por tal coisa...,” “Morria de tanto rir,” “Tal coisa me matou de tanto rir” e outras expressões similares. Segundo Copeland, são... Discursos perversos! Palavras de morte! Contrárias à Palavra de Deus![7]
Cristo esclarece que tudo o que fazemos em nossos ministérios, especialmente aquilo que é miraculoso, deve ser precedido por uma absoluta dependência de Deus. A iniciativa deve ser de Deus e não temos nós o direito de soltar a língua como nos agrade.
Se tivéssemos fundamento para suspeitar que estes homens somente estão exagerando, poderíamos ignorar seus ensinamentos. Mas há igrejas, algumas grandes, dedicadas a ensinar estas doutrinas.
Para defender suas ideias, os líderes do movimento baseia-se nos seguintes textos:
“Ao que Jesus lhes disse: Tende fé em Deus; porque em verdade vos afirmo que, se alguém disser a este monte: Ergue-te e lança-te no mar, e não duvidar no seu coração, mas crer que se fará o que diz, assim será com ele. Por isso, vos digo que tudo quanto em oração pedirdes, crede que recebestes, e será assim convosco”. Marcos 11. 22-24
O princípio fundamental da fé está expresso no último versículo. Devemos crer que Deus já respondeu nossa petição antes de que a formulemos. Esta é a base para uma declaração positiva de nossa fé na vontade de Deus, tanto para escutarmos como para respondermos.
A confissão positiva é certamente melhor que a negativa. Mas sem uma base bíblica sólida, pode levar a uma visão errada da realidade. A passagem mencionada nunca significou um cheque em branco para qualquer coisa que desejemos ou digamos. É mais um padrão básico de fé que pode ser exercitada quando o Senhor nos dá uma promessa pessoal.
Há que observar que o texto começa com a frase “Tende fé em Deus”. O grego original é: exete pistin theou, que literalmente se lê como “ter fé de Deus”. Isto se conhece gramaticalmente como um genitivo absoluto e somente significa “tende fé em Deus”. Assim se traduz corretamente em todas as versões modernas.
Cristo nos esclarece que tudo o que fazemos no ministério deve estar precedido por uma absoluta dependência de Deus. A iniciativa deve ser dEle, e nós não temos o direito de fazer o que nos agrada. O texto na verdade não se refere ao uso de um princípio místico de fé, do qual Deus mesmo depende.
No contexto do capítulo, Jesus amaldiçoou a figueira e esta secou. Pedro, sempre curioso, ressalta isto no versículo 21: “Mestre, eis que a figueira que amaldiçoaste secou”, como quisesse dizer: “Como pudeste fazer isso?”. Os versículos que se seguem, então, são meras explicações de como o fez: “Primeiro, Pedro, tens que estar operando NO Espírito, e não ser impulsivo. Deves identificar qual seja a vontade do Pai, e ao conhecê-la atuar em fé”.
É claro que Jesus não usa estas palavras, mas uma análise cuidadosa do texto e outras passagens relacionadas, nos revelam que essa é a intenção do texto.
Existe uma grande diferença entre o exercício ordinário da fé em nossas vidas e o dom especifico da fé, que recebemos por revelação direta de Deus. Este último se confirma em 1 Co 12.9 como um dom sobrenatural. Em tal contexto, nota-se que não é para todos e nem em todos os casos. Paulo diz: “... a outro, fé pelo mesmo Espírito...”.
Murchar as figueiras e mover as montanhas não são coisas de todos os dias na vida do crente. Por sua natureza excepcional requer um dom sobrenatural de fé divina. Conseguir compreender tudo isto nos guiará a uma posição equilibrada sobre a fé e a confissão positiva consequente. Marcos 11.24 não é um texto que prove que temos o direito de obter qualquer coisa que desejemos. O exercício de nossa fé baseia-se na vontade de Deus declarada previamente. Podemos ter o que seja que declaremos... Deus o disse primeiro.
Tiago, capítulo 3
Os proponentes da super-fé, usualmente usam este capítulo como apoio do seu ponto de vista, segundo o qual as circunstâncias que rodeiam a existência humana são determinadas pelas confissões negativas ou positivas.
O versículo 6 é um texto favorito da Palavra de Fé, já que se refere à língua como capaz de acender fogo à “roda da criação”. No entanto, o contexto deste capítulo, combinado com a análise do texto grego, nos leva a concluir que Tiago se referia a algo diferente de uma manipulação da realidade através da língua.
A frase “roda da criação” é ton trochon tes geneseos em grego e é de difícil tradução. Trochon literamente significa “roda”, egeneseos origem, fonte, nascimento, existência, vida. No Dicionário Expositivo Vine descreve-se a esta roda que acende fogo desde seu eixo interno e o manda para fora, justamente como o dano que causa a língua.
Tiago refere-se simplesmente a influência que tem nossa língua no marco de nossas relações humanas. Diz: "Com ela abençoamos ao Deus e Pai, e com ela amaldiçoamos aos homens, que são feitos à semelhança de Deus". Está acaso referindo-se ao controle das forças naturais, nossa saúde ou finanças mediante nossa língua? Claro que não! Tiago refere-se a nossas relações, já que se falamos mal das pessoas que nos rodeiam, isto naturalmente afetará o curso da nossa vida, nos encheremos de inimigos.
Nossa fofoca destruirá a outros e a nós mesmos. Usar este capítulo 3 de Tiago para provar que todas as circunstâncias de nossa existência são controladas pelas palavras que proferimos, em qualquer sentido mais além de nossas próprias relações humanas, é — sem dúvida — violentar o texto.
Estás preso com as palavras da tua boca. Provérbios 6.2.
Citar este texto como uma advertência contra a declaração negativa é tomá-lo fora do seu contexto. Não refere-se a nenhum tipo de confissão positiva ou negativa, se não que adverte a evitar ser garantia nas dívidas contraída por amigos. O texto completo é: "Filho meu, se ficaste por fiador do teu companheiro e se te empenhaste ao estranho, estás enredado com o que dizem os teus lábios, estás preso com as palavras da tua boca".
E, sobre a palavra “confissão” na Bíblia? Alguns mestres do movimento assinalam que este termo em grego é homologia, que se compõe de homo, igual – logeo, falar. Consequentemente, segundo eles, significaria “falar a mesma coisa”. Quer dizer, se falamos “a mesma coisa que Deus”, obteremos o resultado desejado.
Incorreto. Na era pré-cristã, a palavra tinha esse significado, mas na época em que o Novo Testamento foi escrito, o significado que tem é “professar fé em algo ou alguém”. Das quarentas vezes usadas no Novo Testamento (na forma mencionada e na maneira enfáticaexhomologeonai o verbo homologeo), em nenhuma delas há apoio ao ponto de vista de que as palavras de nossa boca tenham algum poder criador. Observem alguns usos do Novo Testamento:
Profissão de Fé
Nos mestres falsos, Tito 1.16; em Cristo, Lucas 12.8; dos fariseus nos anjos e na ressurreição, Atos 23.8; os espíritos admitindo ou negando a Deidade de Cristo, 1 João 4.3.
Confissão do pecado
Dos feiticeiros convertidos em Éfeso e declarando publicamente suas obras, Atos 19.18; dos cristãos confessando seus pecados a Deus, 1 João 1.9; dos crentes confessando suas culpas uns aos outros, Tiago 5.16.
Promessa a alguém
Judas prometendo trair a Cristo, Lucas 22.6.
Ação de graças
De Jesus ao Pai (Lucas 10: 21).
Não existe nenhuma só pista na Bíblia que apóie o uso da palavra “confissão”, no uso que atribuem os mestres da declaração positiva.
Dois problemas graves:
Além da errônea aplicação das Escrituras, existem dois problemas graves no ensino da doutrina positiva:
A. Ênfase excessiva
As epístolas foram expressamente escritas para instruir aos crentes sobre como viver de forma vitoriosa, mas de forma alguma se vê aquele tipo de ênfase dado neste movimento. Ademais, às vezes encontram algumas declarações supostamente negativas pronunciadas pelo mesmo apóstolo Paulo:
... contudo, Satanás nos barrou o caminho (I Tessalonicenses 2.18).
Porque a mim me parece que Deus nos pôs a nós, os apóstolos, em último lugar, como se fôssemos condenados à morte; porque nos tornamos espetáculo ao mundo, tanto a anjos, como a homens (I Coríntios 4.9).
Até à presente hora, sofremos fome, e sede, e nudez; e somos esbofeteados, e não temos morada certa (I Coríntios 4. 11).
Aos que levam o ministério de Deus com responsabilidade, não ensinam ao seu rebanho que podem desatar forças espirituais negativas, somente com pronunciar certas palavras ou frases comuns. Os apóstolos não viram que a realidade dos fatos poderiam ser uma declaração negativa, nem tiveram temor de expressá-lo. Este tipo de temor não provém de uma fé bem sustentada, ao contrário, manifesta uma falta de fé.
B. Generalização de casos particulares
Dos dois problemas apontados, este é o mais grave, pois é aqui onde se machucam as pessoas. Como temos estudado, os mestres da Palavra da Fé consideram a prosperidade e a saúde do crente como verdade absoluta: Todo cristão, sem exceção, deve estar e ser saudável e próspero ao momento presente, já que Deus declarou que assim é Sua Vontade, segundo eles. Portanto, não se considera necessário orar ou pedir revelação sobre estes dois aspectos.
Quando vermos que esta premissa da Palavra da Fé é insustentável, compreenderemos quão perigoso é lançar-se a uma fé assim, sem sustentar-se na vontade de Deus primeiramente. Os que procedem dessa forma encontram-se com certeza em problemas e dores.
Existe uma armadilha muito sutil neste aspecto. Suponhamos que a vontade de Deus é que o Sr. Fulano prospere, mas não busca a vontade de Deus primeiramente. Lança-se à fé, seguindo as fórmulas dos livros. Os resultados? Voilá! Funciona! Então Fulano assume que tudo funcionou porque os mestres da Palavra de Fé são verdadeiros, ensinando verdades absolutas que todos podem chegar a experimentar. Fulano não considera que a vontade de Deus para sua vida se cumpriu nele, de maneira pessoal, não universal.
Agora suponhamos que João proclame estas boas notícias a um irmão da igreja, e este lança-se de igual maneira que João, mas para ele tudo termina em frustração e fracasso. Então, este irmão culpa a Deus, perde a fé e entra em uma crise emocional. Se houvesse buscado primeiramente a vontade de Deus, poderia escutar algo como: “Não, filho, isso não é para ti, essa foi minha vontade para fulano, eu tenho algo melhor para ti. Quero que me sirvas na Índia e, se fores fiel, te considerarei digno de sofrer por amor ao meu nome, e inclusive que teu sangue seja sangue de mártir”.
Poderíamos considerar a algum deles superior ao outro, se ambos encontram a vontade de Deus em suas vidas?
Os crentes devem reconhecer a soberania de Deus
As Assembléias de Deus, a maior denominação pentecostal do mundo, denuncia o ensinamento da Palavra da Fé sobre a confissão positiva com estas palavras:
Fazer finca-pé na confissão positiva tem a tendência de incluir frases que parecem indicar que o homem é soberano e Deus seu servo. Estas frases que exigem Deus atuar, implicam que Ele entregou sua soberania; que não está na capacidade de atuar de acordo com sua sabedoria e propósito. Faz-se referência a que a verdadeira prosperidade consiste em usar o poder e a capacidade de Deus para satisfazer necessidades, quaisquer que estas sejam. Assim, posiciona-se o homem usando a Deus, em lugar de o homem render-se e ser usado por Deus.[8]
Uma manifestação insólita de Kenneth Copeland
Até esta data, a manifestação mais insólita que escutei dos mestres do movimento sobre a confissão positiva, proveio de Copeland durante um programa televisado na cadeia TBN, no dia 12 de Novembro de 1985.
Depois de humildemente pedir a Deus permissão para manifestar esta “verdade”, Copeland virou-se para Paul Crouch, o anfitrião, e lhe fez esta pergunta: “Você sabe quem é o maior fracassado da Bíblia?”. Crouch ficou perplexo, sem responder, assim Copeland lhe informou. “O maior fracassado da Bíblia é Deus!”
Copeland explicou que Deus era incapaz de impedir que suas criaturas se rebelassem contra Ele. Deus era realmente surpreendido por suas criaturas, mas não entrava em pânico nem fazia confissões negativas, porque Ele sabia que fazer tais confissões, o fariam ver como um fracassado.
Então Deus, explicou Copeland, buscou uma solução. Orar não seria a solução porque não havia a quem pedir. Jejuar também não, porque Deus não come. Então lhe ocorreu uma solução: A semente da fé! Sim! Deus plantaria uma semente porque sabia que a lei da semente da fé sempre funciona. Qual foi essa semente que Deus plantou? Seu filho Jesus, é claro. Onde a plantou? No inferno para que sofresse pelos pecados. Jesus esteve no inferno como um pecador condenado em nosso lugar.
No que diz respeito a Deus, Jesus já não existia. A única esperança que Deus tinha era a lei da semeadura e da colheita combinada com sua confissão positiva. Deus sabia que isso sempre trás resultado. Portanto, quando Jesus — que estava no inferno sofrendo como um pecador condenado — nasceu de novo pelo Espírito, três dias depois saiu com poder. Resultado: Deus não somente obteve seu filho de volta, como também conseguiu muitos mais filhos.
Sim, explicou Copeland, Deus teve fé. Ele sabia que a lei da semente da fé sempre funciona. Os aplausos e vivas que Copeland recebeu da audiência cristã, incluindo a Paul Crouch, por esta revelação, foram ensurdecedores.
Neste capítulo aprendemos que...
• O movimento da fé pratica o ocultismo por meio de um conceito distorcido da confissão positiva.
• Na teoria ocultista, a mente controla a realidade. As palavras têm um poder próprio e permitem transferir imagens mentais à realidade.
• De acordo com o ensinamento da Palavra da Fé, o cristão deve visualizar o que quer obter, para logo criá-lo com sua palavra e sua confissão positiva.
• O termo “confissão” tem somente dois significados na Bíblia: Professar a crença em uma verdade ou admitir a culpa. Nunca se refere a um poder próprio da palavra.
Dr. Roger Smalling é pastor presbiteriano, Mestre em Teologia (USA), diretor e fundador da Visión R.E.A.L
[1] Quinto capítulo do Livro THE PROSPERITY MOVEMENT: Wounded Charismatics por Rev. Roger L. Smalling, D. Min. http://smallings.com/LitEng/litEnglish.html
[2] Copeland, Kenneth, The Power of the Tongue (O Poder da Lingua), Copeland Publications, 1996, p.19.
[3] Copeland, Kenneth, The Laws of Prosperity (As Leis da Prosperidade), Copeland Publications, 1974, p. 98.
[4] Copeland, Kenneth, The Power of the Tongue (O Poder da Lingua), Copeland Publications, 1996, p.19.
[5] Dentre os ensinos deste movimento está a Confissão Positiva. A confissão positiva não é uma denominação nem uma seita, mas um movimento no seio das igrejas pentecostais e neo-pentecostais que enfatiza o poder do crente em adquirir tudo o que quiser. Seu surgimento foi gradual, a partir de Essek William Kenyon (1867-1948). Uns são unicistas, outros deificam o homem, há ainda os que pregam um Jesus exótico, estranho ao Novo Testamento, e se caracterizam por pregarem saúde e prosperidade como instrumento aferidor da vida espiritual do cristão. Suas fontes de autoridade são a Bíblia, as revelações de seus líderes e a palavra da fé (NE).
[6] Capps, Charles, The Tongue as a Creative Force (A Língua , uma Força Criativa), Harrison House, 1977, p. 81.
[7] Copeland, Kenneth, The Laws of Prosperity, Copeland Publications, 1974, p. 98. Capps, Charles, Success Motivation, Harrison House, 1982, p. 26.
[8] O crente e a confissão positiva, Declaração oficial das Assembléias de Deus, reunião do Presbitério Geral (EUA), agosto, 1980. Veja: http://ag.org/ top/beliefs/ position_ papers/ 4183_confession.cfm
Fonte:Os Puritanos
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