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Por André R. Fonseca
Outro dia minha mãe me perguntou: "Como vai o curso pra pastor, filho?"
Rindo, respondi: "Mãe, quando Jesus perguntou a Pedro se ele o amava, ele disse para apascentar suas ovelhas. No meu caso, Cristo falou: André, tenha pena das minhas ovelhas!"
Mas a pergunta é bem comum. Sempre que alguém fica sabendo que estou no seminário, logo pergunta sobre a ordenação pastoral - como se o único motivo de ir para o seminário fosse o chamado pastoral. Até os professores do seminário, às vezes, parecem surpresos quando o aluno diz que está cursando por outro propósito. Outro dia um amigo bem chegado, que me conhece muito bem, vem com um livro de presente dizendo que olhou pro livro e pensou em mim. Título: Ministério pastoral, profissão ou vocação. Fala sério...
Gente, pera lá, brincadeira tem hora! Ter o André como pastor será um pesadelo! Vejo que posso contribuir como professor, teólogo, qualquer atividade mais acadêmica. Mas pastorado, não... há excelência demais no ministério pastoral, e não me enquadro! Vamos para o texto bíblico no qual me apoio para dizer que não sou vocacionado.
Filipenses 2:20-22 "Pois Timóteo é o único que se preocupa com vocês como eu me preocupo e é o único que, de fato, se interessa pelo bem-estar de vocês. Pois todos os outros se preocupam com os seus próprios interesses e não com os de Jesus Cristo. E vocês sabem muito bem como Timóteo provou o seu valor. Ele e eu, como se fôssemos filho e pai, temos trabalhado juntos no serviço do evangelho."
É claro que o texto não trata especificamente do ministério ou vocação pastoral. Não é um texto como o de Tito 1:5-16 onde Paulo traça o perfil do líder da igreja com suas qualidade e outros pontos a serem considerados para determinar se há vocação ao pastorado. Não é, nem de longe, um texto normativo; mas retrata perfeitamente aquilo que entendo como o contexto para o vocacionado. Permita-me dividir o texto de Filipenses em três partes: 1) Interesse pelas ovelhas, 2) dedicação ao ministério e 3) propósito na ordenação.
Sabemos que Paulo escreve duas cartas conhecidas como "pastorais" a Timóteo. São duas das três cartas pastorais, e provavelmente Timóteo recebeu a última ou uma das últimas cartas que Paulo escreveu antes de morrer.Que Paulo instruiu seu "filho" Timóteo para seguir o seu legado no cuidado "pastoral" da Igreja é inquestionável, até porque Timóteo ficou no cuidado das igrejas na Ásia.
Paulo aconselha Timóteo a não abandonar sua vocação em 1 Timóteo 4:15. E onde está o sinal dessa vocação em Timóteo? Acredito que a resposta está em Filipenses! Paulo, à semelhança de Pedro, tem amor pelas ovelhas; e Paulo acaba testemunhando que Timóteo era o único em sua companhia que manifestava o mesmo cuidado pela ovelhas - "Pois Timóteo é o único que se preocupa com vocês como eu me preocupo e é o único que, de fato, se interessa pelo bem-estar de vocês..."
Ainda no contexto de aconselhamentos pastorais de Paulo a Timóteo no capítulo 4 de primeira Timóteo, percebemos a dedicação do vocacionado ao ministério:"para progredir na vida cristã, faça sempre exercícios espirituais... pratique essas coisas e se dedique a elas a fim de que o seu progresso seja visto de todos..." 1 Timóteo 4:7 e 16.
A consagração de Timóteo ao ministério pastoral é consequência de seu serviço. Não basta ter amor pelas ovelhas e dedicação ao estudo da Palavra, oração ou quaisquer exercícios espirituais. É preciso ter um propósito para a consagração ao pastorado, e o que determina esse propósito é o serviço - "pratique essas coisas e se dedique a elas a fim de que o seu progresso seja visto de todos... E vocês sabem muito bem como Timóteo provou o seu valor. Ele e eu, como se fôssemos filho e pai, temos trabalhado juntos no serviço do evangelho." 1 Timóteo 4:15 e Filipenses 2:22
Meu serviço é que justifica minha ordenação ao ministério pastoral. Acho que já estava até na hora de repensarem essa prática de consagrarem seminaristas ao ministério pastoral só porque concluíram seus seminários. Para que uma "igreja com propósito" cheia de pastores sem propósito?
Mas também não basta ter um serviço que justifique minha ordenação, é preciso ter dedicação aos elementos ou qualidades que compõem o ministério. E por fim, é preciso ter amor pelas ovelhas; caso contrário, corremos o risco de alimentar um mercenário... que Deus me livre de ser um deles!
Não quero dizer com isso que não tenho interesse pelo bem-estar das ovelhas, ou que meu interesse por elas seja vil. Mas se não é o interesse puro, profundo, correto e completo dentro deste ministério, a coisa pode facilmente sair dos trilhos. Tudo o que é forçado não acaba bem! Então, antes de qualquer coisa, eu preciso ter isso confirmado e trabalhado por Deus no meu coração. Enquanto permanecer a incerteza quanto ao que sinto pelas ovelhas de Cristo, minha resposta permanecerá: não tenho vocação pastoral!
Tenho grande dedicação ao estudo teológico, mas a dedicação pastoral não se resume a isso. Acredito também que não só de pastores vive a igreja, ela também precisa de professores dedicados. Portanto, vejo que facilmente posso ser um mestre; pastor, não.
E ainda que esses dois pontos possam ser questionados e trabalhados por Deus para apontar numa direção ao ministérios pastoral, ainda sou seminarista. Em breve, serei um bacharel em teologia, só isso! Enquanto não houver um serviço (ministerial) que justifique uma ordenação, me deixa quieto...
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Autor: André R. Fonseca
www.andreRfonseca.com
Twitter: @andreRfonseca
Quando não especificado, todos os textos bíblicos são citações da NTLH - Nova Tradução na Linguagem de Hoje da SBB.
Fonte da imagem: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Shepherd_on_the_way_to_Hampta_Pass.jpg
Fonte: Teologia et cetera
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