sábado, 20 de abril de 2013

A Trindade: da teoria à prática - Parte 3/5


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Por Rev. Leandro Lima


Aspectos Bíblicos da doutrina da Trindade

Aqueles que negam a existência da Trindade, em geral acusam os trinitarianos de inventar uma doutrina que não está na Bíblia. Embora o termo “Trindade” realmente não seja encontrado na Escritura, existe toda uma convicção de que essa doutrina é amplamente comprovada pelos textos sagrados. Aliás, de onde tal doutrina poderia surgir senão da Revelação de Deus? Quem poderia formular essa doutrina do nada?

A igreja teve que reconhecer e defender a Trindade exatamente para poder conciliar os elementos bíblicos. Como crer que há somente um Deus como as Escrituras afirmam (Dt 6.4), se as próprias Escrituras dizem que Jesus também é Deus (Jo 20.28)? E do mesmo modo afirma que Jesus e o Pai são pessoas distintas (Mt 3.16-17)?

Evidências do Antigo Testamento

No Antigo Testamento podemos encontrar indícios da existência da Trindade. Ela não está explicitamente exposta no Antigo Testamento, mas à luz da revelação do Novo Testamento podemos ver indícios claros dessa doutrina ainda no Antigo Testamento.

Uma coisa que fica absolutamente clara é a ênfase do Antigo Testamento na unicidade de Deus (Dt 4.35,39; 32.39; 2Sm 22.32; Is 37.20; 43.10). A principal confissão de fé do povo hebreu em Deuteronômio 6.4 diz: “Ouve Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor”. Da mesma forma Isaías 45.18 diz: “Porque assim diz o SENHOR, que criou os céus, o único Deus, que formou a terra, que a fez e a estabeleceu; que não a criou para ser um caos, mas para ser habitada: Eu sou o SENHOR, e não há outro”. Porém, encontramos em muitos outros textos claras indicações de que dentro da divindade há mais de uma pessoa.

O Nome de Deus

O título “Elohim”, traduzido como Deus em Gênesis 1.1, é o nome mais comum aplicado à divindade no Antigo Testamento. Esse nome está no plural. Isso por si só não quer dizer que haja três pessoas na divindade, mas de alguma maneira implica em pluralidade dentro da divindade. Entendemos o texto de Gênesis 1.1-3 à luz do texto de João 1.1-2 como sendo uma referência à obra do Pai, do Filho e do Espírito Santo na Criação.

A comunicação de Deus consigo mesmo

Textos como Gênesis 1.26, 3.22, 11.7 e Isaías 6.8 têm sido bastante difíceis de explicar. Nesses textos é como se Deus falasse consigo mesmo na primeira pessoa do plural: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança...” (Gn 1.26). Com quem Deus estava falando nesses momentos? Certamente não era com os anjos, pois o homem não foi feito à semelhança dos anjos, nem os anjos estão no mesmo nível de Deus. [5] E a Bíblia não diz que Deus tome conselho com anjos ou qualquer outra criatura (Is 40.13-14). A resposta mais plausível é que Deus falava consigo mesmo dentro da Trindade.
Esse entendimento só é possível à luz da revelação do Novo Testamento, a qual de uma maneira ainda mais clara demonstra o relacionamento dentro da Trindade, conforme pode ser visto nas palavras do próprio Jesus: “Respondeu Jesus: Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada” (Jo 14.23). O mesmo “nós” dos textos do Antigo Testamento pode ser visto no relacionamento de Jesus com o Pai.

A repetição dos nomes de Deus na Bênção Araônica

Na Bênção Araônica lemos: “O SENHOR te abençoe e te guarde; o SENHOR faça resplandecer o seu rosto sobre ti, e tenha misericórdia de ti; o SENHOR sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz” (Nm 6.24-26). Três vezes aparece no texto o título SENHOR. À luz da revelação do Novo Testamento, especialmente da Bênção Apostólica, onde as três pessoas estão claramente distintas (2Co 13.13), conseguimos ver na Bênção Araônica indícios da Trindade. [6]

O Anjo do SENHOR

Uma boa referência do Antigo Testamento sobre a Trindade encontra-se na pessoa do Anjo do SENHOR. O caso é que algumas vezes esse Anjo, que deve ser distinguido dos demais anjos, se identifica com o próprio Senhor, enquanto que em outras ocasiões ele é distinguido do Senhor, o que nos leva a pensar em pluralidade de personalidade (Ver Gn 16.7-13; 22.15-16; Gn 31.11-13; Ex 3.2-6; Ex 23.23, 32.34 e Nm 20.16). Geralmente associa-se essa figura do Anjo do SENHOR com a Segunda Pessoa da Trindade.

Aparições de Deus

Talvez a prova mais evidente do Antigo Testamento com relação à Trindade encontre-se nas aparições de Deus. A Escritura do Novo Testamento diz que ninguém jamais viu a Deus (Jo 1.18; 5.37; 6.46; 1Jo 4.12). Como explicar, então, todas as supostas aparições de Deus no Antigo Testamento? (Gn 18.1; 28.13; Ex 33.18-23; Dt 34.10). João mesmo explica: “Ninguém jamais viu a Deus, o Deus unigênito que está no seio do Pai, é quem o revelou” (Jo 1.18). João chamou Jesus de Logos (Jo 1.1) que é traduzido como Palavra ou Verbo, e traz a ideia de fala ou comunicação.

Entendemos então, que Jesus foi o revelador da pessoa divina no Antigo Testamento. Jesus disse que Abraão havia visto o seu dia, pois existia antes de Abraão (Jo 8.56-58), referindo-se com certeza à ocasião da destruição de Sodoma e Gomorra, quando Abraão viu o Senhor, conforme relata Gênesis 18.1:“Apareceu o SENHOR a Abraão nos carvalhais de Manre, quando ele estava assentado à entrada da tenda, no maior calor do dia”. Quem Abraão viu naquele dia, foi o próprio Jesus antes de sua encarnação. Depois daquele encontro, os anjos desceram e destruíram as cidades.

Outro texto que ajuda a perceber que Jesus se manifestou no Antigo Testamento é João 12.37-41: “E, embora tivesse feito tantos sinais na sua presença, não creram nele, para se cumprir a palavra do profeta Isaías, que diz: Senhor, quem creu em nossa pregação? E a quem foi revelado o braço do Senhor? Por isso, não podiam crer, porque Isaías disse ainda: Cegou-lhes os olhos e endureceu-lhes o coração, para que não vejam com os olhos, nem entendam com o coração, e se convertam, e sejam por mim curados. Isto disse Isaías porque viu a glória dele e falou a seu respeito”. Note que João disse que Isaías viu a glória de Jesus. Mas, quando, e em que ocasião? O verso 40 é uma citação direta do capítulo 6 de Isaías. E podemos ler o seguinte no início do capítulo 6:

“No ano da morte do rei Uzias, eu vi o Senhor assentado sobre um alto e sublime trono, e as abas de suas vestes enchiam o templo. Serafins estavam por cima dele; cada um tinha seis asas: com duas cobria o rosto, com duas cobria os seus pés e com duas voava. E clamavam uns para os outros, dizendo: Santo, santo, santo é o SENHOR dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória. As bases do limiar se moveram à voz do que clamava, e a casa se encheu de fumaça. Então, disse eu: ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos!” (1-5).

Isaías disse ter visto o SENHOR dos Exércitos. E se João disse que Isaías tinha visto Jesus, então o SENHOR e Jesus são a mesma pessoa. A conclusão é que todas as vezes que Deus foi visto no Antigo Testamento, era a Segunda Pessoa da Trindade se manifestando. Portanto, o Antigo Testamento tem bons indícios da existência da Trindade.

Provas do Novo Testamento

O Novo Testamento é muito mais decisivo em sua ênfase trinitária. Há muitos relatos que nos dão a justa ideia de que Deus é um e é três ao mesmo tempo.

No Batismo de Jesus

O texto do batismo de Jesus narra: “Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre ele. E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu filho amado, em quem me comprazo” (Mt 3.16-17). Note que há três personagens presentes no relato. Jesus está sendo batizado, o Espírito está descendo sobre ele, e o Pai está falando dos céus. Inconfundivelmente, aí estão, simultaneamente as três pessoas da Trindade.

Na Fórmula Batismal

Jesus disse: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28.19). Nesse texto, não somente as três pessoas são citadas conjuntamente, como a expressão “em nome” está no singular. A Escritura não diz “batizando-os no nome do Pai, no nome do Filho e no nome do Espírito Santo”. Há apenas um nome para o Deus que subsiste em três pessoas.

Na Bênção Apostólica

O texto diz: “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (2Co 13.13). Por que Paulo colocaria esses três nomes em pé de igualdade, se não considerasse como pessoas da mesma divindade? Seria Paulo idólatra? Então, fica claro que a Bíblia afirma a existência da Trindade.

Em Apocalipse 1.4-5 a Bênção é pronunciada de forma ligeiramente diferenciada, mas as três pessoas estão presentes: “Graça e paz a vós outros, da parte daquele que é, que era e que há de vir, da parte dos sete Espíritos que se acham diante do seu trono e da parte de Jesus Cristo, a Fiel Testemunha, o Primogênito dos mortos e o Soberano dos reis da terra”.

Na obra da Salvação

A Escritura mostra em passagens como 1Pedro 1.1-2 e Judas 20-22, Pai, Filho e Espírito Santo agindo em pé de igualdade na vida dos crentes na eleição, na redenção e durante todo o processo da santificação. A Trindade conjuntamente age em favor dos escolhidos.

Na Capacitação da igreja

Nas passagens de 1Coríntios 12.4-6 e Efésios 4.4-6 que tratam da maneira como Deus capacita sua igreja, para em unidade, desenvolver sua tarefa no mundo, as três pessoas da Trindade são mencionadas como sendo a base pela qual a igreja sobrevive e age no mundo. João 14.16 também faz menção da Trindade, mas nesse caso é o Espírito Santo que vem através do pedido do Filho ao Pai para substituir o próprio Filho no meio da igreja.

No Ensino de Cristo

Ao mesmo tempo em que Cristo disse que Deus era seu Pai que estava no céu (Mt 5.16; 7.21; 11.25-27), disse que não eram a mesma pessoa (Mt 16.27; Jo 10.17), e disse também que era “Um” com ele (Jo 10.30, 38). A comparação entre as palavras de Jesus nos leva a crer que existe mais de uma pessoa na Divindade. E esse certamente é o maior argumento bíblico a favor da divindade: a consciência do próprio Jesus. Ele sabia e demonstrou que era alguém diferente do Pai e ao mesmo tempo “um” com o Pai.

Em 1João 5.7. O texto mais claro na Bíblia com relação à Trindade é 1João 5.7. Entretanto, esse texto é amplamente controvertido, e muito provavelmente não seja realmente original, pois não aparece na maioria dos códices gregos antigos, nem nos latinos e não é citado pelos pais Anti-Nicenos. Mas, há grande evidência da antiguidade desse texto, quem sabe antes mesmo de 160 d.C [7], demonstrando que a doutrina da Trindade já era tão antiga quanto essa data sugere.

Todos esses elementos bíblicos considerados conjuntamente deixam a certeza de que há um só Deus, que subsiste em três pessoas: O Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Notas:
[5] Ver Gerard Van Groningen. Criação e Consumação, Vol I, p. 32.
[6] Embora alguns vejam na repetição dos adjetivos “santo, santo, santo” em Isaías 6.3 um indício claro da Trindade, não desejamos ir tão longe, pois na língua hebraica a repetição visa enfatizar aquilo que está sendo dito. O mesmo talvez não possa ser dito de Daniel 9.19 e Isaías 33.22.
[7] Ver Excelente estudo sobre o texto em Herman Bavinck. The Doctrine of God, p. 265-266. Para uma opinião contrária ver John Sttot. I, II, III João – Introdução e Comentário, p.155.

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