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Por Renato César
Enquanto para Paulo a questão da soberania de Deus para escolher uns em detrimento de outros se exauria sem uma resposta clara para os motivos divinos, a lógica arminiana sugere que Paulo é que não soube explicar. Se Paulo tivesse sido um arminiano instruído, a reposta dele em Rm 9:20 teria sido mais ou menos esta:
“Ó homem, Deus em sua soberania anteviu aqueles que nele creriam, havendo com base nisso escolhido a uns e rejeitado a outros. Mas se ainda assim tu questionas o fato de que alguns estiveram em melhores condições para crer que outros, tu bem deverias saber que Deus, em sua onisciência, a todos provou sob as mesmas circunstâncias, havendo dado as mesmas condições de escolha a todos. Contudo, nem todos aceitaram de bom grado o evangelho, e por isso Deus decidiu a uns eleger e a outros rejeitar”.
Pronto, estariam sanadas todas as dúvidas.
Mas olhando para a resposta aparentemente evasiva de Paulo em Rm 9:20, a questão que surge a partir da teoria arminiana é a seguinte: Por que Paulo não falou nestes termos aos seus destinatários? Afinal, a explicação arminiana não é tão difícil de ser compreendida para que se dê uma resposta tão insatisfatória como a que Paulo deu. Ao contrário! Seria bastante incoerente para alguém tão capacitado como Paulo, primeiro a sistematizar a teologia cristã, que usava, e muito bem, argumentos lógicos para fundamentar seu ponto de vista, nem sequer tentar explicar o critério usado por Deus para eleger alguns e rejeitar outros.
Ainda mais notável é o fato de que na ocasião mais propícia de toda a Bíblia para explicar-se a eleição divina de alguns em detrimento de outros, ela simplesmente se calou! Em nenhuma outra passagem esse tema é tratado de forma tão direta e prolongada. O apóstolo Paulo tinha em suas mãos a grande oportunidade de elucidar definitivamente o questionamento a respeito da possível injustiça cometida por Deus, apresentando a solução arminiana e, assim, pondo fim aos questionamentos da eleição divina. Mas ele não o fez.
Só pode haver uma justificativa plausível para Paulo haver dado uma resposta tão limitada: a eleição divina se baseia em motivações que estão além da compreensão humana, e, logo, a lógica arminiana não é aplicável. O apóstolo compreendia a eleição divina como decisão soberana de Deus, incondicional e independente da participação do homem. Logo, não havia para o apóstolo nenhum argumento capaz de explicar a motivação divina além dele (Deus) mesmo, e por isso Paulo fez questão de deixar claro no v. 16 que “não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece”. Os versos seguintes reforçam muito bem essa ideia. A motivação de Deus é ele mesmo, e disso decorrem as demais conclusões: para mostrar seu poder, para sua glória, para tornar seu nome conhecido e qualquer outro motivo que diga respeito a ele, Deus.
A mesma justificativa vale para a paciência divina para com o incrédulo. O motivo de Deus ser paciente não é outro senão ele mesmo. Rm 9:22 atesta tal conclusão: ele suportou pacientemente os “vasos da ira, preparados para a perdição” para “mostrar sua ira, e dar a conhecer seu poder”. Deus não fundamenta suas escolhas em nada além dele mesmo.
Paulo não poderia jamais usar a justificativa arminiana para a eleição divina porque, se assim fizesse, precisaria vincular a decisão de Deus eleger a uns e rejeitar a outros a uma visão antecipada do comportamento humano, vinculando, consequentemente, a decisão de Deus à decisão do homem e criando uma relação de dependência entre a decisão do Criador e a decisão da criatura. O apóstolo, felizmente, sabia que tal entendimento estaria ferindo o caráter autônomo (independente, livre de qualquer influência externa) de Deus. Por isso, na ocasião que mais se esperava que uma grande questão fosse de uma vez por todas resolvida, Paulo preferiu deixar a questão sem uma resposta arminiana que atendesse ao apelo da racionalidade humano, e deu uma resposta calvinista.
O homem quer saber com base em que critérios Deus decidiu a favor de uns em detrimento de outros. A razão humana nos impele a buscar um motivo razoável. Para muitos, dizer que o motivo pertence a Deus não basta, e Deus precisa se fundamentar num critério que o homem possa compreender. Mas, ao que tudo indica, Paulo não pensava da mesma forma. Nem nós, calvinistas.
Obs: As alusões ao arminianismo e ao calvinismo não estão levando em conta o aspecto cronológico. Obviamente, Paulo não era nem seguidor de um nem de outro, visto que viveu muito antes. O objetivo é tão somente criar um paralelo entre o que afirmam as duas teorias e o posicionamento de Paulo quanto à eleição divina no texto em análise.
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Sobre o autor: Cristão reformado, formado em administração de empresas e teologia, membro da IPB - Fortaleza/CE.
Artigo enviado por e-mail.
Contatos com o autor: renatocesarmg@hotmail.com
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Divulgação: Bereianos
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