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Estudiosos de diferentes matizes têm reconhecido a decidida contribuição prestada pelo movimento calvinista ao aperfeiçoamento das instituições políticas do mundo ocidental. As noções reformadas sobre a ordem política foram inicialmente articuladas por João Calvino e posteriormente aprofundadas em alguns pontos e modificadas em outros pelos seus sucessores.
Calvino expôs as suas idéias sobre o estado no último dos oitenta capítulos de sua obra magna, a Instituição da Religião Cristã. Por causa de sua reflexão firmemente apoiada nas Escrituras, o reformador tinha um elevado conceito acerca do estado e dos governantes civis. O apóstolo Paulo havia ensinado que as autoridades são "ministros de Deus" e foram por ele instituídas com vistas ao bem comum, merecendo assim a obediência dos cidadãos (Epístola aos Romanos, cap. 13). Calvino, seguindo a mesma linha de raciocínio, acentuou que a carreira pública era uma das mais nobres funções a que um cristão podia aspirar e deixou claro que os cidadãos tinham o dever de obedecer as leis e honrar os seus magistrados. Os governantes, por sua vez, tinham solenes e graves responsabilidades diante de Deus em relação às pessoas entregues aos seus cuidados.
Ao escrever sobre o assunto, Calvino estava em parte reagindo contra os anabatistas, que desprezavam as instituições políticas e o exercício de cargos públicos como algo indigno de um cristão, e contra os diferentes grupos de anarquistas e revolucionários da época. Como a maior parte dos protestantes do século XVI, ele era favorável a uma estreita associação entre a igreja e o estado, cada qual respeitando a esfera de atuação do outro. A alegação de que Calvino teria sido o ditador de Genebra é injustificada. Na realidade, ele nunca exerceu nenhum cargo político naquela cidade e durante grande parte da sua estadia ali teve um relacionamento difícil com os magistrados civis, sempre desejosos de interferir nos negócios da igreja.
Se o pensamento político de Calvino é essencialmente conservador, dois fatores levaram os calvinistas a adotarem teorias mais democráticas: as perseguições sofridas na França, Inglaterra e Escócia, e o exemplo de Genebra, com o seu governo republicano. O direito de oposição aos tiranos, admitido apenas excepcionalmente por Calvino, foi defendido de modo explícito pelo francês Philippe Duplessis-Mornay, pelo escocês George Buchanan e pelo autor anônimo de Vindiciae Contra Tyrannos, obra popular entre os huguenotes franceses do século XVII. Nas Ilhas Britânicas, o presbiterianismo, com sua ênfase no governo eclesiástico por presbíteros livremente eleitos pela comunidade, atraiu a ira de vários monarcas que não queriam abrir mão do "direito" de nomear os bispos e assim mais facilmente controlar a igreja.
No entanto, a nova cosmovisão religiosa dos reformados e as práticas dela decorrentes foram ainda mais fundamentais para as suas concepções políticas progressistas. A teologia protestante e calvinista valorizou o indivíduo, colocado em uma relação pessoal com Deus e libertado da dependência eclesiástica. Na igreja, ele era convocado a colaborar com seus concidadãos na tarefa de governo e administração, a exercer o seu direito de voto com um forte senso de responsabilidade e a fazer a sua parte quando convocado para o serviço público, sendo ainda educado para exercer o direito de supervisão e até mesmo de crítica dos governantes. Além disso, a valorização do trabalho, as oportunidades de mobilidade social, o direito à livre iniciativa e o pleno acesso à educação, todos esses característicos do protestantismo calvinista, também foram fatores decisivos para o desenvolvimento da democracia no Ocidente.
Os reformados entendem que Deus é o senhor de toda a vida e, portanto, todas as áreas da atividade humana são importantes para o cristão, inclusive a esfera política. Assim sendo, deve-se evitar toda e qualquer dicotomia entre o "sagrado" e o "secular" ou "profano." Essa convicção tem levado muitos calvinistas a se envolveram com a atividade pública, entendida como um importante serviço prestado a Deus e à coletividade. Dois exemplos notáveis são Woodrow Wilson, presidente da Universidade de Princeton, presidente dos Estados Unidos (1913-1921) e ganhador do Prêmio Nobel da Paz, e Abraham Kuyper, teólogo e líder político holandês, fundador da Universidade Livre de Amsterdã e primeiro-ministro da Holanda de 1901 a 1905. Embora a separação entre a igreja e o estado seja necessária para a democracia, os reformados entendem que não deve haver um divórcio entre suas convicções ético-religiosas e sua atuação na vida pública.
Fonte: Monergismo
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