segunda-feira, 7 de abril de 2014

16 argumentos que mostram que Cristo não morreu pela salvação de todos os homens

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Por John Owen


1. Dois argumentos baseados na natureza do novo concerto

Argumento 1 - Em Mateus 26:28 o Senhor Jesus Cristo fala de "o meu sangue, o sangue do Novo Testamento". Este novo "testamento", ou "concerto" é um novo acordo, ou contrato, que Deus fez para salvar os homens. O sangue de Cristo derramado em Sua morte, é o preço desse acordo, e diz respeito somente àqueles a quem o acordo se aplica.

Este novo acordo, ou aliança, é diferente do velho acordo que Deus fez com os homens. Pelo velho acordo (ou concerto) Deus prometeu salvar todos os que guardassem as Suas leis: "o homem que fizer estas coisas viverá por elas". (Romanos 10:5; Levítico 18:5). Mas, em razão dos homens serem pecadores, eles não podem guardar as leis de Deus. Portanto, o velho acordo ficou sem efeito.

No novo acordo, Deus promete colocar Suas leis em nossas mentes e escrevê-las em nossos corações (Hebreus 8:10). É claro, então, que esse acordo diz respeito somente àqueles em cujos corações e mentes Deus realmente faz isso. Desde que Deus, obviamente, não faz isso para todos os homens, todos os homens não podem estar incluídos no acordo pelo qual Cristo morreu.

Alguns têm sugerido que Deus iria escrever Sua lei em nossas mentes se apenas crêssemos. Mas, fé é a mesma coisa que ter a lei de Deus escrita em nossos corações!

Então, falar como alguns, significa dizer: "se a lei está em nossos corações (isto é, como ela é, em todos os crentes), Deus promete que Ele irá escrever Sua lei em nossos corações" - o que é uma tolice! A natureza do novo concerto deixa claro que a morte de Cristo não foi por todos os homens.

Argumento 2 - O evangelho - em outras palavras, as novas sobre o novo concerto - tem estado no mundo desde os tempos de Cristo. Contudo, nações inteiras têm vivido sem qualquer conhecimento dele. Se o objetivo da morte de Cristo era salvar todos os homens, sob a condição de que eles cressem, então o evangelho devia ter sido anunciado a todos os homens.

Se Deus não providenciou para que todos os homens ouvissem o evangelho, então, ou deveria ser possível que todos os homens fossem salvos sem fé e sem conhecimento do evangelho, ou o propósito de salvar todos os homens falhou, uma vez que nem todos os homens ouviram o evangelho. A primeira afirmativa não pode ser verdadeira, pois a fé é uma parte da salvação (ver Parte Dois, capítulo cinco). A última afirmativa também não pode ser verdadeira; seria próprio da sabedoria de Deus enviar Cristo para morrer a fim de que todos os homens fossem salvos, sem, contudo, certificar-Se de que todos os homens ouvissem o evangelho? Seria a benignidade de Deus demonstrada através de tal comportamento?

Isso seria como se um médico dissesse que tem um remédio que curaria a doença de todos. E, no entanto, escondesse, deliberadamente, tal conhecimento de muitas pessoas. Poderíamos realmente argumentar, nesse caso, que o médico pretendia, genuinamente, curar a doença de todos?

Há muitos versículos bíblicos que deixam claro que milhões jamais ouviram uma palavra sobre Cristo. E não podemos apresentar outra razão para isso, senão a razão que o próprio Jesus deu: "Sim, ó Pai, porque assim te aprouve". (Mateus 11:26). Tais versículos como Salmo 147: 19-20; Atos 14: 16; Atos 16: 6-7; confirmam os fatos de nossa experiência comum de que o Senhor não tomou qualquer providência para assegurar que todos ouvissem o evangelho. Precisamos concluir que não é propósito de Deus salvar todos os homens.

2. Três argumentos baseados nas descrições bíblicas da salvação

Argumento 3 - As Escrituras descrevem o que Jesus Cristo obteve com Sua morte como "redenção eterna" (isto é, nossa libertação do pecado, da morte e do inferno, para sempre). Ora, se esta bênção foi comprada para todos os homens, então todos os homens têm esta redenção eterna automaticamente; ou ela está à disposição de todos os homens na dependência do cumprimento de certas condições.

De acordo com nossa experiência, não é verdade, de maneira alguma, que todos os homens têm redenção eterna. Portanto, seria a redenção eterna disponível sob certas condições?

Pergunto, Cristo satisfez essas condições por nós, ou apenas nos tornamos merecedores do cumprimento dessas condições se outras condições forem cumpridas por nós? A primeira dessas afirmativas - que Cristo realmente cumpriu todas as condições necessárias quanto ao dom da redenção eterna - significa que todos os homens têm realmente essa redenção; o que, como já temos visto, não concorda com nossa experiência a respeito dos homens! Temos que dizer, portanto, que se Cristo não cumpriu as condições para que todos os homens obtivessem a redenção, Ele deveria ter cumprido essas condições apenas por aqueles que cumpririam outras condições. Estamos agora andando em círculos, fazendo com que aquelas condições que foram cumpridas dependam de que outras condições sejam cumpridas! Estes argumentos demonstram quão irracional é supor que Cristo morreu a fim de obter a salvação eterna para todos os homens.

Se insiste ainda que a redenção eterna é obtida sob o cumprimento de certas condições, então, todos os homens deveriam ser notificados. Mas, esse conhecimento lhes tem sido sonegado, como vimos na Terceira Parte, capítulo um.

Além disso, se a obtenção da redenção eterna depende do homem cumprir condições, então ou eles têm ou não têm o poder para fazer isso. Se são capazes por si mesmos de cumprir as condições necessárias, então temos que dizer que todos os homens podem, por si mesmos, crer no evangelho. Mas isto é bastante contrário às Escrituras, as quais mostram que os homens estão mortos em pecado e, portanto, não podem cumprir quaisquer condições.

Se concordamos que os homens não podem, por si mesmos, cumprir as condições para a obtenção da salvação eterna, então, ou Deus intenta dar-lhes esta habilidade, ou não. Se Ele realmente intenta isto, então, por que não o faz? Assim, todos os homens seriam salvos.

Se, entretanto, Deus não pretende dar a todos os homens a capacidade de crer, e, contudo, Cristo morreu para que todos os homens tenham a salvação eterna, então, Deus está requerendo dos homens que tenham habilidades as quais Ele recusa dar-lhes. Isto não seria uma loucura? É como se Deus prometesse dar a um homem morto o poder de vivificar-se a si mesmo, mas ao mesmo tempo não tenha a intenção de lhe dar o poder prometido!

Argumento 4 - A Bíblia descreve cuidadosamente aqueles pelos quais Cristo morreu. Lemos que toda a raça humana pode ser dividida em dois grupos, e que Cristo morreu apenas por um desses grupos.

Os versículos bíblicos que mostram que Deus dividiu os homens em dois grupos são:

Mat. 25:12 e 32 Jo. 10:14,26
Jo. 17:9, 1Ts. 5:9
Rom. 9:11-23

Daí aprendemos que há aqueles a quem Deus ama, e aqueles a quem Ele odeia; aqueles a quem Ele conhece, e aqueles a quem Ele não conhece.

Outros versículos deixam claro que Cristo morreu apenas por um destes dois grupos. É-nos dito que Ele morreu por:

Seu povo - Mt. 1:21
Suas ovelhas - Jo. 10:11,14
Sua igreja - At. 20:28
Seus eleitos - Rom. 8:32-34
Seus filhos - Heb. 2:13

Acaso não deveríamos concluir, de tudo isso, que Cristo nã morreu por aqueles que não são Seu povo, ou Suas ovelhas, ou Sua Igreja? Ele não pode, portanto, ter morrido por todos os homens.

Argumento 5 - Não devemos descrever a salvação de nenhuma maneira diferente daquela que a Bíblia a descreve. E a Bíblia não diz, em lugar algum, que Cristo morreu "por todos os homens", ou por cada homem em particular. Ela diz que Cristo deu Sua vida "em resgate de todos"; entretanto, isso não pode provar que signifique mais que "todas as Suas ovelhas" ou "todos os Seus eleitos". Se estudarmos cuidadosamente qualquer versículo que emprega a palavra "todos" e o examinarmos em seu contexto, logo estaremos convencidos de que, em lugar algum, as Escrituras dizem que Cristo morreu por todos os homens, sem exceção de nenhum.

(Na Quarta Parte, capítulos três e quatro, vamos considerar, detalhadamente, muitos versículos bíblicos nos quais as palavras "mundo" e "todos" são usadas em conexão com a morte de Cristo.)

3. Dois argumentos baseados na natureza da obra de Cristo

Argumento 6 - Há muitos versículos bíblicos que falam do Senhor Jesus Cristo tornando-Se responsável por outros na Sua morte; por exemplo:

Ele morreu por nós - Rom. 5:8
Foi feito maldição por nós - Gál. 3:13
Foi feito pecado por nós - 2Co. 5:21

Tais expressões deixam claro que qualidade de substituto de outro.

Ora, se Ele morreu em lugar de outros, segue-se que todos aqueles cujo lugar Ele tomou devem estar agora livres da ira e do julgamento de Deus. (Deus não pode punir justamente Cristo e aqueles a quem Ele substituiu!) Contudo, está claro que nem todos os homens estão livres da ira de Deus (ver João 3:36). Portanto, Cristo não pode ter sido o substituto de todos os homens.

Se insiste ainda que Cristo realmente morreu como um substituto de todos os
homens, então devemos concluir que Sua morte não foi um sacrifício bastante suficiente, pois nem todos os homens são salvos do pecado e do julgamento!

De fato, se Cristo realmente morreu em lugar de todos os homens, então, ou Ele Se ofereceu a Si mesmo como um sacrifício por todos os pecados deles (neste caso, todos os homens são salvos), ou foi um sacrifício por alguns dos pecados deles apenas (neste caso, ninguém é salvo, pois alguns pecados permanecem). Nem uma nem outra dessas declarações pode ser verdadeira, como nós já temos visto neste livro (Primeira Parte, capítulo três). Deve ser evidente que não podemos dizer, de maneira alguma, que Cristo morreu por todos os homens.

Argumento 7 - As Escrituras descrevem a natureza da obra que Cristo realizou, como a obra de um mediador e de um sacerdote:

Ele "é Mediador dum novo Testamento" (Hebreus 9:15). Ele age como um mediador sendo o sacerdote daqueles que Ele leva a Deus. Que Jesus Cristo não é o sacerdote de todos é óbvio, tanto pela experiência como pelas Escrituras; nós já discutimos isso na Segunda Parte, capítulo dois.

4. Três argumentos baseados na natureza da santidade e da fé

Argumento 8 - Se a morte de Cristo é o meio pelo qual aqueles por quem Ele morreu são purificados do pecado e são santificados, então Ele deve ter morrido somente por aqueles que realmente estão limpos de pecados e santificados. É óbvio que nem todos os homens são santificados. Portanto, Cristo não morreu por todos os homens.

Talvez eu deva provar que a morte de Cristo é, de fato, o meio para obter a purificação e a santidade. Vou fazer isso de duas maneiras:

Primeira, o padrão de adoração do Velho Testamento destinava-se a ensinar verdades a respeito da morte de Cristo. O sangue dos sacrifícios do Velho Testamento fez com que aqueles por quem era derramado se tornassem adoradores aceitáveis a Deus. Se foi assim, quanto mais o sangue de Cristo deve realmente purificar do pecado aqueles por quem Ele morreu? (Hebreus 9: 13-14).

Segunda, há versículos bíblicos que declaram com clareza que a morte de Cristo faz realmente as coisas que ela intencionava fazer; o corpo do pecado é destruído, para que não mais sirvamos ao pecado (Romanos 6:6); temos redenção através do Seu sangue (Colossenses 1: 14); Ele Se deu a Si mesmo para nos remir e nos purificar (Tito 2: 14). Estes versículos, e muitos outros, enfatizam que a santidade é o resultado certo nas vidas daqueles por quem Cristo morreu. Visto que todos os homens não são santos, Cristo não morreu por todos os homens.

Alguns sugerem - inutilmente! - que a morte de Cristo não é a única causa dessa santidade. Dizem que ela somente se torna verdadeira ou real quando o Espírito Santo a traz, ou quando é recebida por fé. Mas a obra do Espírito Santo, e o dom da fé, são também o resultado ou o fruto da morte de Cristo! Assim sendo, essa sugestão não altera o fato que a verdadeira santidade é o resultado certo somente nas vidas daqueles por quem Cristo morreu. O fato do juiz dar permissão ao carcereiro para destrancar a porta da prisão, não é a causa do prisioneiro ser posto em liberdade; a causa é que alguém pagou seus débitos por ele.

Argumento 9 - A fé é essencial à salvação. Isso é claro nas Escrituras (Hebreus 11:6) e a maioria das pessoas aceita o fato. Mas, como já temos visto, tudo que é necessário para a salvação foi obtido para nós por Cristo.

Ora, se esta fé essencial é obtida para todos os homens por Cristo, então é nossa com ou sem certas condições. Se é sem condições, então todos os homens a têm. Mas isso é contrário à experiência, e também às Escrituras (2 Tessalonicenses 3:2). Se a fé é dada somente sob certas condições, então eu pergunto: sob que condições?

Alguns dizem que a fé é dada sob a condição de que nós não resistamos à graça de Deus. Contudo, não resistir significa, realmente, obedecer. Obedecer significa crer. Portanto, o que estes amigos realmente estão dizendo é: "a fé é concedida somente àqueles que crêem" (isto é, àqueles que têm fé!). Isso é completamente absurdo.

Por outro lado, alguns argumentam que a fé não é obtida para nós pela morte de Cristo. Então, seria a fé um ato de nossa própria vontade? Mas isso é bastante contrário àquilo que muitos versículos bíblicos ensinam, e ignora o fato de que os incrédulos estão mortos em pecados, incapazes de realizar qualquer ato espiritual (I Coríntios 2:14). Portanto, volto à posição de que a fé é obtida por Cristo. 

A fé é uma parte essencial da santidade. No Argumento 8, mostrei que a santidade é obtida para nós pela morte de Cristo. Portanto, Ele também obteve a fé para nós. Negar isso é dizer que Ele obteve apenas uma santidade parcial, isto é, uma fé deficiente. Ninguém sugere isso seriamente. Mais ainda, Deus escolheu Seu povo, como nos é dito, a fim de que ele fosse santo; Deus "nos elegeu ... para que fôssemos santos" (Efésios 1 :4). Repetindo, a fé é uma parte essencial da santidade. Ao eleger Seu povo para ser santo, necessariamente Deus decidiu que ele teria fé.

Era parte do pacto entre Deus, o Pai, e Deus, o Filho, que todos aqueles por quem Cristo morreu tivessem as bênçãos que o Pai tencionava dar-lhes. A fé é uma das bênçãos que o Pai dá (Hebreus 8:10,11).

As Escrituras afirmam claramente que a fé é obtida para nós por Jesus Cristo, que é "o autor e consumador da fé" (Hebreus 12:2). Declarações como esta e as declarações dos três parágrafos acima, que acabamos de ler, confirmam, todas elas, que a morte de Cristo obtém fé para Seu povo. Visto que não são todos os homens que a têm, Cristo não pode ter morri do por todos os homens.

Argumento 10 - O povo de Israel era, de muitas maneiras, uma espécie de ilustração da Igreja de Deus do Novo Testamento (I Coríntios 10:11). Seus sacerdotes e sacrifícios eram exemplos daquilo que Jesus viria fazer pela Igreja de Deus. Jerusalém, a cidade deles, é usada como uma figura do céu do crente (Hebreus 12:22).

Um verdadeiro israelita é um crente (João 1:47) e um verdadeiro crente é um israelita (Gálatas 3:29). Portanto, eu argumento da seguinte maneira:

Se a nação dos judeus foi escolhida por Deus, entre todas as nações do mundo, para ilustrar Suas relações com a Igreja, segue-se, então, que a morte de Cristo foi somente pela Igreja e não pelo. mundo todo. A maneira como Deus tratou o Seu povo escolhido no Velho Testamento é uma ilustração de que a salvação obtida por Cristo não é para todos os homens, mas é apenas para o Seu povo escolhido.

5. Um argumento baseado no significado da palavra "redenção"

Argumento 11 - A maneira como a Bíblia descreve uma doutrina deve nos ajudar a entender a doutrina. Uma palavra bíblica que é usada para descrever a salvação obtida por Cristo é a palavra redenção. Exemplo: " ...temos a redenção pelo seu sangue" (Colossenses 1:14). Essa palavra significa "libertar uma pessoa do cativeiro através do pagamento de um preço". A pessoa não está redimida a não ser que seja libertada. Por isso, a própria palavra nos ensina que Cristo não pode ter obtido a redenção para aqueles que não estão livres. A redenção universal (assim chamada!) que finalmente deixa alguns ainda no cativeiro é uma contradição de termos.

O sangue de Cristo é realmente chamado de preço, e de resgate, em alguns versículos bíblicos (vide Mateus 20:28). Ora, o propósito de um resgate é obter a libertação daqueles pelos quais o preço é pago. É inconcebível que um resgate seja pago e a pessoa ainda continue prisioneira. Por conseguinte, como pode ser argumentado que Cristo morreu por todos os homens, quando nem todos os homens são salvos? Somente os que estão realmente livres do pecado podem ser aqueles por quem Cristo morreu. "Redenção" não pode ser "universal", como "romano" não pode ser "católico"! A redenção tem que ser particular, visto que somente alguns são redimidos.

6. Um argumento baseado no significado da palavra “reconciliação

Argumento 12 - Uma outra palavra que a Bíblia usa para descrever aquilo que
Cristo obteve mediante Sua morte, é a palavra reconciliação: "...inimigos... vos reconciliou." (Colossenses 1:21). Reconciliação quer dizer restaurar as relações de amizade entre duas partes que anteriormente eram inimigas. Na salvação, da qual a Bíblia nos fala, Deus é reconciliado conosco e nós somos reconciliados com Deus. 

Estas duas coisas têm que ser verdadeiras; a reconciliação de uma parte e da outra são dois atos separados, mas ambos são necessários para tornar uma reconciliação completa. É uma tolice sugerir que Deus, por intermédio da morte de Cristo, agora está reconciliado com todos os homens, mas que somente alguns homens estão reconciliados com Ele. Espero que ninguém sugira que Deus e todos os homens estão reconciliados desta maneira. Isso seria uma reconciliação capenga! Não há verdadeira reconciliação a menos que ambas as partes estejam reconciliadas uma com a outra.

O efeito da morte de Cristo foi a reconciliação tanto de Deus com os homens como os homens com Deus; "fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho" (Romanos 5:10) e "nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual agora alcançamos a reconciliação." (Romanos 5:11). Ambas as reconciliações são, também, mencionadas em II Coríntios 5:19-20 - "Deus ... reconciliando consigo", e "vos reconcilieis com Deus"

Ora, como esta dupla reconciliação pode ser "reconciliada" com a noção de que
a morte de Cristo é para todos os homens, eu não posso entender! Porque, se todos os homens são, pela morte de Cristo, assim duplamente reconciliados, como pode acontecer que a ira de Deus esteja sobre alguns? (João 3:36). Sem dúvida alguma, Cristo somente pode ter morri do por aqueles que estão realmente reconciliados.

7. Um argumento baseado no significado da palavra " satisfação"

Argumento 13 - E verdade que a palavra satisfação não é usada na versão inglesa da Bíblia, com referência à morte de Cristo. Mas, aquilo que a palavra significa, isto é, "um pagamento total daquilo que é devido a um credor por um devedor" é um pensamento frequentemente usado no Novo Testamento, quando se refere à morte de Cristo.

Em nosso caso, os homens são devedores a Deus, pois falharam em obedecer aos Seus mandamentos. A satisfação requerida para pagar nosso pecado é a morte - "o salário do pecado é a morte" (Romanos 6:23). As leis de Deus nos acusam, expressando a justiça e a verdade de Deus. Perante elas estamos convictos de que somos seus transgressores, merecendo, portanto, morrer. A salvação só é possível se Cristo pagar nosso débito e, assim, satisfazer a justiça de Deus. Sua morte é chamada de uma "oferta" (Efésios 5:2) e de"propiciação" (l João 2:2). A palavra oferta significa um sacrifício de expiação ou um sacrifício para fazer reparação devido o pecado.

Propiciação significa uma oferta para satisfazer a justiça ofendida. Dessa forma, podemos usar corretamente a palavra satisfação para abranger todo o ensino bíblico quanto ao significado da morte de Cristo.

Ora, se Cristo pela Sua morte realmente fez uma satisfação por alguns, então Deus precisa agora estar completamente satisfeito com eles. Deus não pode requerer licitamente um segundo pagamento de qualquer espécie. Então, como pode ser que Cristo tenha morrido por todos os homens e ainda muitos vivam e morram como pecadores sob a condenação da lei de Deus? Reconciliem essas coisas aqueles que podem! Afirmo que somente os que estão realmente livres do débito nesta vida podem ser aqueles pelos quais Cristo pagou a satisfação.

8. Dois argumentos baseados no valor da morte de Cristo

Argumento 14 - O Novo Testamento fala, frequentemente, do valor da morte de Cristo, com a qual Ele pôde comprar e obter certas coisas. Exemplo: é dito que a redenção eterna é obtida "por seu próprio sangue" (Hebreus 9:12); é dito que a Igreja de Deus foi resgatada "com seu próprio sangue." (Atos 20:28); e os cristãos são chamados "povo adquirido" (I Pedro 2:9).

Cristo por Sua morte, então, comprou para todos aqueles por quem Ele morreu, todas aquelas coisas que a Bíblia salienta como resultados de Sua morte. O valor da Sua morte comprou a libertação do poder do pecado e da ira de Deus, da morte e do poder do diabo, da maldição da lei e da culpa do pecado. O valor da Sua morte obteve a reconciliação com Deus, paz e redenção eterna. Estas coisas são agora dons gratuitos de Deus, porque Cristo as comprou. Se Cristo morreu por todos os homens, por que então todos os homens não têm essas coisas? Será que o valor da Sua morte não é suficiente?

Será que Deus é injusto por não dar a todos aquilo que Cristo comprou? Tem que ser óbvio que Cristo não pode ter morrido para adquirir essas coisas para todos os homens, e sim somente para aqueles que realmente desfrutam delas.

Argumento 15 - Há frases que são frequentemente empregadas para se fazer referência à morte de Cristo, tais como: morrendo por nós; suportandonossos pecados; sendo nossa segurança. O significado evidente de tais frases é que Cristo, em Sua morte, foi um substituto de outros para que eles pudessem ser livres.

Se, em Sua morte, Cristo foi um substituto de outros. como podem eles mesmos morrerem também, carregando ainda seus próprios pecados? Assim sendo, Cristo não pode ter sido um substituto a favor deles. Daí, fica claro que Ele não pode ter morrido por todos os homens.

De fato, dizer que Cristo morreu por todos os homens é a maneira mais rápida de provar que Ele não morreu por ninguém. Porque se Ele morreu em lugar de todos, e, contudo, nem todos são salvos, então Ele falhou em Seu propósito.

9. Um argumento geral baseado em versículos específicos das Escrituras 

Argumento 16 - Há um grande número de versículos bíblicos que eu poderia usar para argumentar que Cristo não morreu pelos pecados de todos os homens. Vou selecionar apenas nove, e, com eles, encerrar nossos argumentos nesta parte.

1. Gênesis 3: 15. Este é o primeiro versículo bíblico no qual Deus indica que há uma diferença entre o povo de Deus e seus inimigos. "...sua semente"(da mulher) significa Jesus Cristo e, portanto, também todos os crentes em Cristo. (Isto é claro a partir do fato de que a profecia sobre a semente da mulher é cumprida em Cristo e em Seu povo). "...tua semente" (da serpente) significa todos os homens incrédulos do mundo (Vide João 8:44). Desde que Deus prometeu somente inimizade entre a semente da serpente e a semente da mulher, é óbvio que Cristo, a semente da mulher, não morreu pela semente da serpente!

2. Mateus 7:23. Cristo aqui declara que há pessoas que Ele jamais conheceu. Contudo, em outro lugar (João 10:14 a 17) Ele diz que conhece todo o Seu povo. Será que Ele não conhece todos aqueles por quem morreu? Se há alguns que Ele não conhece, então Ele não pode ter morrido por eles.

3. Mateus 11:25-27. Conforme estas palavras, é claro que há alguns dos quais Deus esconde o evangelho. Se é a vontade do Pai que o evangelho não seja revelado a eles, Cristo não pode ter morrido por eles. E nós devemos notar que Cristo, aqui, agradece ao Pai por fazer esta diferença entre homens - uma diferença que somente alguns homens ainda se recusam a acreditar!

4. João 10:11, 15-16, 27-28. Destes versículos fica bastante claro que:

I. Nem todos os homens são ovelhas de Cristo.
II. A diferença entre os homens um dia será óbvia.
III. As ovelhas de Cristo são identificadas como "aquelas que ouvem a voz de Cristo"; outros não a ouvem.
IV. Alguns que ainda não são identificados como ovelhas já estão escolhidos e se tornarão conhecidos ("outras ovelhas").
V. Cristo morreu, não por todos, mas especificamente por Suas ovelhas.
VI. Aqueles por quem Cristo morreu são os que Lhe foram dados pelo Pai. Ele não pode, então, ter morrido por aqueles que não Lhe foram dados.

5. Romanos 8:32-34. Destes versículos entendemos com clareza que a morte de Cristo pertence somente ao povo eleito de Deus e, também, que a intercessão de Cristo é somente em favor desse mesmo povo.

6. Efésios 1: 7. A partir deste versículo, podemos dizer que se o sangue de Cristo foi derramado por todos, então todos devem ter esta redenção e este perdão. Mas, certamente, nem todas as pessoas os possuem.

7. II Coríntios 5:21. Portanto, em Sua morte Cristo foi feito pecado por todos aqueles que nEle foram feitos justiça de Deus. Se Ele foi feito pecado por todos, então, por que todos não são feitos justiça?

8. João 17:9. A intercessão de Cristo não é por todos os homens, e, portanto, nem a Sua morte o foi. (Ver Segunda Parte, capítulos quatro e cinco).

9. Efésios 5:25. Cristo ama a Igreja e isto é um exemplo de como um homem deve amar a sua esposa. Mas se Cristo amou outros tanto quanto a Sua Igreja, até ao ponto de morrer por eles, então os homens podem certamente amar outras mulheres além de suas esposas!

Pensei que poderia acrescentar outros argumentos - mas, considerando aquilo que já disse, estou certo de que o que já foi argumentado é bastante para satisfazer os que se satisfarão com argumentos; no entanto, aqueles que são obstinados não se satisfarão ainda que eu inclua outros argumentos. Portanto, encerro meus argumentos aqui

***
Fonte: John Owen, Por quem Cristo morreu, págs. 49-70. Editora PES - 1986.

Via Bereianos.

Porta de saída

Por que tantos crentes têm deixado suas igrejas?

Porta de saída
A Palavra de Deus ensina que os crentes formam a família de Deus. O Corpo de Cristo, no modelo bíblico, deve perseverar na caminhada cristã em unidade de espírito e em amor, assim como os fiéis da Igreja primitiva estavam unidos em torno da doutrina dos apóstolos, do partir do pão e da oração, conforme o relato de Atos 2.42. Dessa forma, quem é salvo por Cristo e, assim, pertence à família da fé, o organismo místico que congrega aqueles que um dia foram lavados pelo sangue do Cordeiro, precisam permanecer unidos para funcionarem adequadamente. Nunca se viu uma orelha ou um pé andando por aí, sozinhos, porque se cansaram do corpo do qual faziam parte! A própria parábola da ovelha perdida, registrada em Lucas 15, demonstra que a vontade do Senhor é de que nem um crente sequer fique separado do rebanho. A Carta aos Hebreus ainda admoesta o cristão a não abandonar a sua igreja local, como era o costume de alguns já naquela época.
No entanto, o que temos observado nos arraiais evangélicos é algo bem diferente disso. Já é comum encontrarmos, em nossas igrejas – ou melhor, fora delas –, crentes que se cansaram de ser corpo. Os mais variados motivos são alegados; alguns dos quais, muito razoáveis, como fadiga espiritual, cansaço com modelos eclesiásticos pesados e opressores demais, frustração com a falta de resultados da espiritualidade na vida prática etc. Há quem, ainda, alegue motivos de ordem pessoal, como a intenção de se dedicar mais a projetos próprios ou o desejo de congregar em grupos mais restritos e homogêneos, longe do burburinho eclesiástico. Não há como deixar de fazer juízos de valor acerca de cada uma dessas afirmativas, mas é preciso, para ser justo, avaliar algumas delas à luz do Evangelho e da própria trajetória recente do movimento evangélico no Brasil.
Houve um tempo em que a conversão era tratada como um assunto sério. Tornar-se crente implicava em renúncia. O recém-convertido era estimulado a dar espaço à ação do Espírito Santo em sua vida e abandonar a prática deliberada do pecado. O crente era conhecido como o sujeito que abandonou a bebida, o fumo e a dissolução para viver em novidade de vida, de acordo com os ensinos da Palavra de Deus. E esse processo passava, necessariamente, pela igreja. Essa ruptura com o mundo gerava no indivíduo uma noção arraigada de pertencimento ao grupo pelo qual conhecera o Evangelho.
Pelo batismo, o novo crente se vinculava a uma família de fé – a igreja local – e nela construía, ou reconstruía, a sua vida. Era na igreja que ele conquistava amizades profundas e duradouras. As atividades eclesiásticas ocupavam boa parte de sua agenda, e uma das prioridades essenciais era participar dos cultos, colaborar e submeter-se, em amor, às lideranças e desenvolver ministérios voltados para a congregação. Assim, a pessoa, juntamente com sua família, passava anos e até décadas numa mesma denominação, o que gerava uma inarredável identidade confessional. "Sou batista"; ou "sou assembleiano"; ou, ainda, "pertenço à Igreja Quadrangular", era o tipo de resposta que um evangélico dava acerca de sua confissão. Havia identidade com o grupo. A igreja era uma extensão da vida do indivíduo, importante e relevante referência pessoal.
Isso está cada vez mais raro. Nos últimos anos, é possível constatar muita gente se tornando evangélica sem se converter. Busca-se uma igreja ou leva-se para ali uma oferta financeira ou o dízimo em busca apenas de uma recompensa material. As novas igrejas neopentecostais, justamente o grupo religioso que mais cresceu no país nas últimas décadas, redefiniram a conversão. Ser salvo, hoje, não significa ser salvo do pecado, do inferno, da inimizade com Deus, mas sim, ser salvo da dívida, da doença e da pobreza para uma vida de prestígio e sucesso financeiro. Assim, o crente, transformado em consumidor, circula de igreja em igreja em busca dos melhores produtos – e exige ser atendido imediatamente, como um cliente zeloso que paga a fatura e quer levar o produto. Não existe mais interesse e nem tempo para se construir um projeto de vida espiritual a médio e longo prazos. O crente moderno tem pressa em ser atendido. Se não o for num lugar, partirá em busca de outras opções.
Com isso, a experiência do sagrado passa a ser múltipla, ao invés de ligada a um ou, no máximo, poucos grupos eclesiásticos ao longo da vida. "Os migrantes religiosos geralmente recusam laços de pertença definida, e apegam-se a crenças e práticas que lhes parecem melhor adequar-se a si e ao estilo de vida que escolheram", diz o professor Alessandro Bartz, da Escola Superior de Teologia de São Leopoldo (RS). E, diante do fracasso das soluções mágicas, um grande contingente acabas abandonando tudo, passando a engrossar as estatísticas dos desviados da fé.
PORTA AFORA
As próprias igrejas, muitas e muitas vezes, se encarregam de empurrar seus membros porta afora. Não há prestação de contas à congregação, tanto das questões financeiras quanto morais, e a enorme distância entre o pastor e a ovelha é uma constante. O fiel não encontra na igreja aquele ambiente acolhedor para suas angústias e carências espirituais; ao contrário, o ambiente é competitivo, com membros passando a perna uns nos outros em busca de cargos e notoriedade, e isso acontece também devido a modelos adoecidos de liderança. Além disso, não há propostas estimulantes e falta uma mensagem relevante, que ofereça alternativas interessantes àquilo que os membros, sobretudo os mais jovens, encontram fora da igreja. Assim, o culto se torna um ajuntamento chato e sem sentido, com a repetição de liturgias e jargões desprovidos de sentido prático e de uma espiritualidade genuína.
Ao mesmo tempo, o crente sofre o assédio do hedonismo, vertente filosófica da era pós-socrática que professa que o prazer é o bem supremo da vida. Alguém já disse que três coisas movem a sociedade brasileira: sexo, cartão de crédito e drogas. Muitos crentes não escapam disso. Surgiu no seio da Igreja Evangélica brasileira uma geração que não tem mais qualquer disposição para sofrer pelo Evangelho. A busca da gratificação imediata ocupa um espaço considerável na agenda de muitos. As próprias músicas cantadas hoje demonstram tal atitude. Uma delas diz: "Sei que hoje é meu dia, chegou a minha vez". Verbos e termos importantes da fé cristã – como esperar, sofrer, compartilhar, humilhar-se e arrepender-se – foram substituídos por outros, mais de acordo com os tempos em que vivemos: conquistar, vencer, tomar posse e determinar.
O grupo dos desigrejados não para de se avolumar, também, porque uma grande parte da Igreja brasileira perdeu o interesse pelo ensino da Palavra de Deus. O livro A cabana, best-seller de William P.Young, fala com desdém sobre a Escola Bíblica dominical, centenária instituição cristã que deveria estar na base de qualquer igreja que se confessa cristã. Hoje, no entanto, tudo o que muitas igrejas precisam é de um salão com dois banheiros. Não há preocupação em montar uma estrutura de ensino para se atender crianças, adolescentes, jovens e adultos em suas necessidades de conhecimento da Palavra. Geralmente, são muitos cultos por dia, algo que impossibilita o ensino sistemático e consistente da Bíblia.
Existe hoje, no Brasil, uma Igreja Evangélica que não conhece mais a sua história, suas origens e sua teologia. Esses herdeiros da Reforma Protestante desconhecem por completo suas doutrinas, tais como a justificação pela fé, a eleição, a regeneração e a graça salvadora. Por isso, sua crença é débil, sem fundamentação nas Escrituras e na tradição cristã, e faltam-lhe alicerces seguros. Por outro lado, mesmo naquelas denominações onde o estudo da Palavra e a mensagem são consistentes, outras situações são alegadas pelos membros para se afastarem delas: são as contrariedades, decepções ou conflitos comuns a qualquer agrupamento humano, e não deixaria de ser assim nas igrejas, formadas que são por seres humanos.
Porém, não era assim há tempos atrás. Se algo não ia bem numa igreja – se o fiel fosse maltratado pelo pastor ou por algum irmão, ou se suas expectativas não se cumpriam, ele aguardava, e por muito tempo, em oração e resignação. Sua esperança era de que Deus "faria a obra", mudando as coisas, transformando os corações e promovendo o reencontro. Ao mesmo tempo, o crente insatisfeito insistia em permanecer na igreja, colaborando, na medida do possível, para a melhoria das coisas e a escolha de prioridades que lhe pareciam mais acertadas. Ele sabia esperar. Suas raízes estavam fincadas ali e não era qualquer luta que o removeria do lugar onde Deus o colocara.
OVELHAS SOLITÁRIAS
É pena que a mentalidade evangélica tenha mudado tanto, e para pior. Milhões de evangélicos hoje, no Brasil, e principalmente nos grandes centros urbanos, estão, constantemente, circulando de igreja em igreja. Não criam raízes, não conseguem cultivar relacionamentos e são avessos aos compromissos que naturalmente surgem do relacionamento entre o fiel e sua igreja: a frequência aos cultos, a colaboração financeira, o envolvimento nas atividades congregacionais e o engajamento nos projetos da comunidade. Há muita gente, hoje, que prefere visitar uma mega-igreja de vez em quando e simplesmente diluir-se na multidão. Ali, a pessoa entra e sai sem ser notada ou cobrada de alguma coisa.
E quanto àqueles que preferem o chamado "Cristo em casa", ou seja, uma vivência de fé circunscrita ao próprio indivíduo, à sua família ou, no máximo, a um pequeno grupo de amigos que pode ser tudo, menos igreja? Para estes, congregar em uma igreja é algo arcaico e desestimulante. Preferem uma vida de crente não praticante, restringindo sua espiritualidade a práticas devocionais isoladas, sem a boa e enriquecedora troca de experiências e testemunhos, sem discipulado, sem orientação pastoral. Para estes, o risco do esfriamento completo da fé é mais elevado – afinal, ovelha, sozinha, é presa mais fácil para o lobo.
Paulo Romeiro é pastor da Igreja Cristã da Trindade, em São Paulo, e doutor em Ciências da Religião. É autor, entre outros, dos livros Evangélicos em crise e Decepcionados com a graça.
Fonte: Cristianismo Hoje

A Igreja sob risco?


Projetos de leis e ideologias de matriz secular compõem um panorama de enfrentamento à fé cristã.


A Igreja sob risco?
A fé cristã está sob risco no Brasil. Este é o alerta proclamado por líderes religiosos, igrejas, entidades cristãs, organizações confessionais e milhões de pessoas para quem, em um futuro próximo, as liberdades individuais – aí incluída a religiosa, insculpida como direito fundamental no artigo 5º da Constituição –, podem ser severamente afetadas. Não se trata do risco de uma ruptura institucional, como uma revolução, ou a possibilidade de guinada rumo a um regime avesso ao Cristianismo, como o foi o comunismo ao longo de boa parte do século 20. Não; as mudanças que têm ocorrido são perfeitamente legais, já que baseadas em processos legislativos previstos no Estado democrático de Direito. É aí que mora o perigo. Atualmente, tramitam no Congresso Nacional e em diversas Casas parlamentares estaduais e municipais uma série de projetos que, à primeira vista, visam apenas a promover o desenvolvimento de uma sociedade mais justa, pluralista e laica. Porém, alguns desses dispositivos podem não só interferir na expressão individual da fé como flexibilizar questões polêmicas para os cristãos, como a prática do aborto e o consumo de entorpecentes, além de introduzir novos entendimentos da ideia de família, dignidade humana e ética cristã – alguns dos quais, inconciliáveis com a Palavra de Deus.
A coisa não para por aí. O conjunto de projetos, propostas e substitutivos legais em tramitação nos Legislativos federal, estaduais e municipais mostra que o funcionamento das instituições religiosas também pode sofrer alterações, sobretudo em relação ao controle sobre os valores arrecadados e o uso desses recursos. As preocupações aumentaram a partir da tramitação do Projeto de Lei (PL) 122/06, a famigerada lei anti-homofobia, que acendeu a centelha de temores em amplos setores católicos e evangélicos. No texto original, ao tipificar como crime o cerceamento das liberdades da pessoa homossexual, a proposta abria margem para que um gay pudesse exigir de um pastor ou padre ser batizado, casado e recebido como membro da comunidade cristã nessa condição, ainda que isso contrarie os princípios da instituição. Os ministros poderiam ser processados, caso suas prédicas contra a homossexualidade fossem consideradas discriminatórias, ainda que baseadas na própria fé e moral cristã.
No dia 20 de novembro, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal votaria o substitutivo apresentado pelo relator da matéria, o senador gaúcho Paulo Paim, do PT. Com a sala lotada de pastores, representantes de entidades religiosas e políticos evangélicos, a proposta foi retirada de pauta. Houve um acordo entre Paim e as lideranças religiosas para tentar um maior entendimento em torno do texto final. É algo que parece impossível de se conseguir. Em tramitação há mais de 12 anos, o projeto, originado da Câmara dos Deputados, é uma amostra da queda-de-braço entre o segmento religioso e o Legislativo quando o assunto são temas ligados à moral e aos costumes. Tem sido assim desde que a Igreja começou a assumir destaque como ator político, a partir da Assembleia Nacional Constituinte de 1986. Organizados em bancadas religiosas suprapartidárias, parlamentares evangélicos e católicos deixam de lado suas diferenças teológicas para atuar em uma convergência de interesses.
Variadas esferas da vida pública têm sido afetadas nos últimos anos por uma série de iniciativas. A questão dos direitos e liberdades individuais e coletivos, por exemplo. Nas grandes cidades brasileiras, antigas práticas evangelísticas, como cultos ao ar livre e a simples distribuição de folhetos, têm sido cerceadas em nome de ordenamentos municipais. Já não se permite, nos trens suburbanos do Rio de Janeiro, a pregação da Palavra de Deus, sob a justificativa de que provoca incômodo e "constrangimento" aos adeptos de outros credos. "Existe um patrulhamento ideológico difuso, incentivado, por um lado, pelo Estado; e por outro, por setores organizados da sociedade, notadamente antipáticos ao Cristianismo", aponta o teólogo Paschoal Augusto Rheinner, membro da Igreja Metodista em Porto Alegre (RS), onde exerce o magistério cristão. Para ele, essa tendência tem se acentuado nos últimos anos. "Ao mesmo tempo em que o país desperta para agendas positivas, como o combate à discriminação de minorias e a valorização dos direitos humanos, ocorre um retrocesso quando vemos os poderes constituídos se envolvendo em questões que não lhe competem."
Segundo o teólogo, tem havido confusão entre os conceitos de laicidade e laicismo. "Estado laico é aquele que não tem ligação com qualquer confissão e assume uma posição de neutralidade perante as religiões, embora possa colaborar com elas em ações que visem ao bem comum", explica. "Nele, os professantes de qualquer crença, assim como os agnósticos e os ateus, têm respeitado seu direito de expressão". Já o laicismo, continua, é uma ideologia na qual a religião é vista de forma negativa. "Segundo o filósofo alemão Jürgem Habermas, uma autêntica democracia leiga estimula as instituições religiosas a que divulguem suas mensagens, oferecendo à sociedade matéria de reflexão de forma equânime". Rheinner entende que existe uma pressão política no sentido do laicismo, inspirada, entre outros, no modelo francês. "Desde o governo do socialista François Miterrand, nos anos 1980, a França tem caminhado nesta direção, proibindo por lei que cidadãos ostentem adereços pessoais que remetam à sua crença, como véus islâmicos e crucifixos". No Brasil, ele lembra o caso da terceira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), que embute a determinação de se desenvolverem mecanismos para impedir a exibição de ostentação de símbolos religiosos cristãos em estabelecimentos da União. "Isso é uma compreensão equivocada do que se entende por laicidade. Tais símbolos não ofendem a liberdade religiosa de ninguém. Eles são elementos da nossa história, cultura e tradição."
"ABERRAÇÃO JURÍDICA"
"O que está em jogo, no Brasil, é a continuidade da democracia que tanto prezamos", receia o pastor Stênio de Oliveira, da Comunidade Cristã dos Discípulos de Curitiba (PR). "Quando se fala em punir um pai que corrija seu filho com uma palmada ou submeter a escrutínio externo as contas de uma igreja, que por força constitucional são imunes à interferência estatal, é razoável o temor". O pastor tem veiculado artigos nas redes sociais, alertando a sociedade em relação a uma escalada de pressões sobre o Cristianismo e seus valores no Brasil, incluindo aqueles restritos à esfera pessoal – caso do PL nº 7672/10, popularmente denominado como lei da palmada, que estabelece que os pais podem perder o poder familiar e até sofrer processos legais caso "pratiquem violência física" contra os filhos. "Isso é uma absurda tentativa de intromissão do Estado sobre questões de foro íntimo, típica de sistemas de governo autoritários". O mais perigoso, sustenta Oliveira, é que as regras são relativas, jogando sua interpretação e aplicação ao pantanoso terreno da subjetividade.
"No momento em que, mundialmente, advoga-se a tese do direito penal mínimo, isto é, uma diminuição dos tipos de conduta que se caracterizam como delito, o governo federal fomenta e investe na aprovação de um projeto de lei que, na sua primeira versão, chegou a prever a prisão de pastores que pregassem que a homossexualidade é pecado", critica o advogado Uziel Santana, presidente da Associação Nacional de Juristas Evangélicos e membro da Igreja Batista Betel, em Aracaju (SE). "O projeto ainda previa o fechamento de igrejas por até três meses. Isso é realmente preocupante, além de constituir uma aberração jurídica."
Doutorando em História do Direito pela Escola de Autos Estudos em Ciências Sociais de Paris, na França, Santana entende que o cenário legal do país ainda está sob a égide do conjunto de liberdades civis fundamentais conquistadas na Constituição Federal de 1988 – entre estas, destaca, a liberdade religiosa, de culto e de expressão. "Com a ascensão ao poder de um partido de esquerda, porém", assevera, "esse modelo democrático de liberdades passou a sofrer sérias tentativas daquilo que denominamos de capitis deminutio, isto é, relativização e ruptura. Vivemos, hoje, na chamada sociedade pós-cristã ou pós-moral, como preferem filósofos como o francês Gilles Lipovetsky, o que na Europa já está muito claro e definido. Há uma espécie de individualização ou internalização da fé, que outrora era expressa normalmente nas esferas institucionais e comuns da sociedade". Para Uziel Santana, o resultado disso é a supressão gradativa das manifestações públicas da fé. "Pelo que tenho visto nos discursos acadêmicos e na atuação de instituições como o Supremo Tribunal Federal, assim o será também no Brasil. Um simples exemplo para ilustrar esse percurso histórico é a impossibilidade que um jogador de futebol cristão tem hoje de, ao marcar um gol, comemorar mostrando uma camisa com frases em louvor a Deus. Isso já é considerado politicamente incorreto."
É preciso reconhecer que alguns exageros têm sido cometidos. A história recente do país mostra que iniciativas que supostamente causariam danos à fé cristã ou ao livre funcionamento das igrejas não acarretaram efeitos tão nocivos. Com o tempo, o que acabou acontecendo foi uma adaptação até mesmo benéfica. A Lei nº 6.515, de 1977, foi um bom exemplo. Anunciada como grave ameaça à família brasileira, a lei do divórcio foi satanizada dos púlpitos como tentativa maligna de destruir a família brasileira. Colaborou para isso o fato de que a separação conjugal era um tabu entre os evangélicos da época. Só que, com a entrada em vigor do novo dispositivo, a questão passou a ser vista sob novos ângulos, e a admissibilidade do divórcio em certos casos passou a ser uma realidade para muitas denominações. A partir dali, inúmeros crentes – pastores, inclusive – resolveram pôr fim a casamentos em crise, até então mantidos apenas por conveniência social. Há pouco mais de dez anos, a entrada em vigor do novo Código Civil (Lei nº 10.406) também assustou os evangélicos, que temiam ingerências no funcionamento das igrejas. Temeu-se até mesmo que templos seriam fechados e que os membros que transgredissem normas internas não mais pudessem ser disciplinados. Não se tem notícia de que uma única igreja tenha sido impedida de funcionar. O que se viu foi uma corrida pela modernização dos estatutos eclesiásticos à luz da nova legislação.
"Creio que a Igreja deve tomar cuidado com os que exageram nas propagandas contra projetos de lei natimortos em sua origem", opina o pastor presbiteriano André Mello. "Tenho muito mais preocupação com as leis de zoneamento urbano, que sempre foram injustas ao privilegiarem o catolicismo. O mesmo ocorre em relação às legislações contra emissão de ruído, seletiva para as igrejas e permissiva com as casas de shows". Ele critica o desconforto exagerado com algumas leis e a desatenção – ou simples desconhecimento – em relação a outras. "O fim da autonomia universitária, a restrição à liberdade de comunicação, o cerceamento da autonomia do mestre em sala de aula, a doutrinação das crianças com conceitos errôneos e a proibição de visitas hospitalares, bem como a vedação da reunião em condomínios e a supressão da educação confessional, são muito mais danosas, pois indicam uma tentativa de o Estado dar prosseguimento à nossa cultura autoritária de efetivo controle sobre o espaço do pensamento e a propriedade privada."
DESCONSTRUÇÃO
Uma conjuntura de fatores tem colaborado para alimentar uma crescente má vontade institucional contra os evangélicos, o que se reflete em tentativas de enfrentamento. A presença do deputado Marco Feliciano (PSC-SP) na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDH) da Câmara dos Deputados foi uma espécie de estopim para arroubos de intolerância religiosa explícita. Conduzido ao cargo em fevereiro passado por uma negociação que envolveu a base parlamentar do governo, o deputado, eleito com 200 mil votos e pastor da Assembleia de Deus Catedral do Avivamento, igreja neopentecostal de São Paulo, sofreu todo tipo de ataques, nos quais se questionou até mesmo sua sexualidade. Tudo seria apenas por conta de suas posturas conservadoras e de declarações consideradas agressivas contra negros e gays – como quando disse que a homossexualidade é uma podridão e a Aids, uma doença gay? Há quem afirme que não. "Minha visão é que existem dois componentes explosivos no caso Feliciano. Primeiro, o fato de ele ser evangélico. Segundo,ter escolhido uma comissão que sempre foi um feudo dos gays", avalia o consultor legislativo do Senado Federal Rubem Amorese, crente presbiteriano e presidente da Missão Social Evangélica. "A CDH sempre foi deles, e dali o movimento homossexual emanava suas ideias, visões e orientações para toda a sociedade". Não por acaso, os maiores ataques a Feliciano partiram de grupos da militância gay e de adversários políticos como o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que chegou ao Congresso empunhando a bandeira do arco-íris.
Réu por estelionato em uma ação penal e investigado em inquérito por discriminação, além de suspeito de usar o mandado em benefício de sua organização religiosa, Feliciano tornou-se mais conhecido como um brucutu homofóbico. Porém, a rejeição seria a mesma, caso o cargo na CDH fosse ocupado por qualquer outro evangélico, segundo Amorese. O mesmo sentimento, aliás, expresso contra qualquer posicionamento mais ruidoso da Igreja em relação a temas como a união civil homoafetiva, já que existe grande resistência evangélica à equiparação de parcerias entre dois homens ou duas mulheres ao casamento convencional. "Na verdade, os projetos sobre 'casamento gay' são bem antigos", continua Amorese. "Mas percebo uma mudança crescente nos últimos dez anos, e ela parece-me ligada à presença do PT no governo. O jeitão ideológico de donos da verdade é bem visível. Da forma de cultivar um jardim à questão gay, eles sabem de tudo e impõem esse saber à sociedade, seja em forma de leis, seja por decisões judiciais, seja publicando cartilhas para estudantes."
A reportagem tentou ouvir o ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, mas as perguntas enviadas à sua assessoria não foram respondidas até o fechamento desta edição. A disseminação de conteúdos antifamília com patrocínio governamental é denunciada pela advogada Damares Alves. Assessora legislativa ligada à Frente Parlamentar Evangélica (FPE), ela acredita que esteja em curso um processo de destruição de valores morais na sociedade brasileira. "Movimento sociais influenciados pela teoria da desconstrução tiveram mais influência no governo PT do que em outros. Valores cristão foram e estão sendo colocados em cheque o tempo todo". Uma das evidências desse processo, ela diz, é a distribuição, nas escolas públicas, de material didático com apologia explícita à iniciação sexual precoce e à valorização do comportamento gay. "Há, na verdade, um projeto ideológico por trás de tudo isso. Esse fenômeno precisa ser observado e acompanhado por todos", defende.
Para Damares, a liberdade religiosa no país está ameaçada. Ela cita como exemplos as restrições cada vez maiores à ação evangélica em áreas indígenas, fato que tem gerado descontentamento não apenas entre as missões como por parte dos próprios povos indígenas, que veem-se alijados de serviços que não são supridos pelo governo federal, a quem compete a política indigenista nacional. "Outra iniciativa danosa é obrigar os hospitais do Sistema Único de Saúde a fazer aborto ou distribuir a pílula do dia seguinte [N.da Redação: esse tipo de medicamento é considerado abortivo, já que interrompe o desenvolvimento de um óvulo já fecundado] a mulheres que apenas aleguem terem tido uma relação sexual não consentida. Isso vai obrigar os hospitais confessionais a se retirarem da rede pública", argumenta.
Uma das atividades da FPE é o monitoramento do movimento legislativo, identificando propostas que, de alguma maneira, possam afetar os evangélicos. "Nossa lista passa de 800 itens", diz Damares. Segundo ela, o maior desafio, hoje, é a reforma do Código Penal, através do PL 236/2012, do Senado Federal. Sob a justificativa lógica de que é preciso reformar uma legislação que remonta aos anos 1940, os legisladores querem tocar em assuntos delicados, como a redução da idade que caracteriza o estupro em uma relação sexual de 14 para doze anos. "Isso seria o mesmo que legalizar a pedofilia", protesta o deputado João Campos (PSDB-GO), um dos líderes da Frente Evangélica no Congresso, que conta com 68 deputados e três senadores. "Somos a favor de mudanças, desde que no sentido de endurecer a legislação penal para diminuir a criminalidade e a impunidade neste país", frisa o deputado. Boa parte desses parlamentares têm participado de reuniões com as presidências das duas Casas e as lideranças partidárias, no sentido de aprofundar o debate em torno do texto proposto, que foi elaborado por uma comissão de juristas sob a coordenação do ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Alguns dos pontos mais combatidos pelos evangélicos são os que tratam de eutanásia, aborto, descriminalização do uso de drogas em pequenas quantidades e vários outros. "Resta saber se a proposta dessa comissão de juristas corresponde à vontade da maioria ou se só de algumas minorias. Só poderemos avaliar isso após um debate amplo, que exige mais tempo", reivindica o parlamentar. "Devo aos homossexuais o meu respeito e não sou homofóbico. Agora, é preciso ter liberdade de expressão. Por exemplo, se você descobre que a babá do seu filho é homossexual e não quer que ela oriente seu filho, já que isso vai contra o que acredita, você não pode despedi-la? Que conversa é essa?", questiona o senador Magno Malta (PR-ES).
ASSIMILAÇÃO DE VALORES
Mestre em Administração Pública e servidor público de carreira, o presidente do Instituto de Fiscalização e Controle (IFC) – entidade cujo foco é o controle de contas públicas e o combate à corrupção –, Henrique Ziller, avalia a questão de outra maneira. Na sua opinião, é fato que os valores cristãos estão ameaçados no país. Porém, ele diz que é a Igreja quem tem desprezado os principais deles. "Quais são os evangélicos que se levantam contra a injustiça, a corrupção, o extermínio dos pobres, o racismo, a falta de serviços públicos de qualidade?", indaga. "Esquecemos as lutas éticas históricas do protestantismo para defender uma agenda diminuta, que olha apenas para as questões morais e sexuais. Deixamos de lado essa herança para abraçar a agenda estreita do protestantismo fundamentalista dos republicanos norte-americanos, que jogam bomba em todo o planeta, condenam os muçulmanos ao inferno e acreditam que Deus só se importa mesmo com as questões do aborto e do homossexualismo". Ziller, defende que não existe uma rejeição ao Evangelho no contexto brasileiro – "A população, de maneira geral, já assimilou a pregação da Palavra e os valores a ela associados. Portanto, não vejo nenhum risco de que a legislação venha a impedir a pregação, até porque vivemos no país em que a própria Justiça não trabalha com leis que não "pegam".
O ponto crítico, para o fiel metodista, é a obrigatoriedade que pretende o movimento LGBT de impor que igrejas aceitem o homossexualismo tanto para a participação nas atividades comunitárias como na ordenação de pastores. "Não faz sentido algum que a lei se imponha em assuntos dessa natureza, de caráter privado das igrejas e denominações, que, na condição de associações privadas, têm o direito de definir as regras que observam ou não", advoga. "A meu ver, a força de um dispositivo legal dessa natureza é nula, de direito e de fato." Ziller vai além, e se posiciona de maneira favorável a que haja algum tipo de controle sobre os caixas eclesiásticos. "A bem da verdade, as igrejas merecem uma perseguição que ainda não aconteceu: a investigação de suas contas."
O pastor batista Clemir Fernandes, doutorando em Ciências Sociais e membro da Fraternidade Teológica Latinoamericana no Brasil, observa que as confrontações à Igreja Cristã crescem na mesma medida de seu gigantismo. "Os tempos são sempre diferentes e o desafio dessa Igreja é buscar interseções com a cultura, às vezes manifestando-se criticamente e rejeitando-a, e às vezes assimilando seus valores". Com a modernidade, prossegue, o mundo tornou-se plural, "mais religioso em alguns aspectos e mais laico em outros" - o que, para ele, tem de ser enfrentado com diálogo, e não necessariamente com oposição sem alternativas.
Fernandes lembra que, em passado recente, a situação da Igreja era bem pior, uma vez que os evangélicos não podiam construir templos, enterrar seus mortos em cemitérios públicos e eram perseguidos em muitos lugares até a metade do século 20. Em face disso, o estudioso acredita que a pregação alarmista de certos segmentos evangélicos pretende apenas a ampliação dos "próprios tentáculos", visando mais poder, seja político, econômico ou religioso. "A força da diversidade de nossa democracia supera a de qualquer movimento sectário e intolerante, seja de grupos religiosos, ateus, homossexuais ou outros. Nossa tradição histórica é o caminho do meio, dificilmente dos extremos."

domingo, 6 de abril de 2014

UM PARALELO ENTRE O CRENTE INGLÊS DO SÉCULO XIX E A IGREJA BRASILEIRA ATUAL



Por Antognoni Misael

Em um dos livros da coleção ‘A formação da classe Operária Inglesa’, especificamente no de Volume três, o autor E.P.Thompson, famoso por uma cosmovisão neomarxista, discorre sobre a formação da consciência da classe de trabalhadores ante o analfabetismo existente entre os ingleses do século XIX.

O que me chamou muita atenção em sua obra foi encontrar registros de que os protestantes daquela época exerceram um papel fundamental na construção do conhecimento, desenvolvimento do senso crítico social, e mais que isso, no processo de alfabetização de parte da população.

Havia uma grande busca pelo crescimento intelectual dentre os cristãos daquela época. Thompson ainda registra que era comum um trabalhador analfabeto andar quilômetros para ouvir um sermão de um pregador cristão. A ideia da obra de Thompson tem a premissa de que o analfabetismo de grande parte daquela massa, cujos cristãos eram maioria, não determinou que o nível de consciência política e social fosse comprometido. Eu vou mais além, digo que não comprometeu a sede em conhecer mais a Deus e que tipo de cosmovisão condizia com os valores dEle.

Thompson ainda relata que os cristãos que abandonavam o analfabetismo o faziam por insistentes leituras na Bíblia Sagrada aliadas as aulas informais solidarizadas por outros operários, enquanto que as suas crianças tinham o privilégio de serem logo cedo, veja:
Se as Sociedades Bíblicas e as sociedades da Escola Dominical não foram frequentadas para nenhum outro bem, pelo menos produziram um efeito benéfico – foram o meio de ensinar muitos milhares de crianças a ler” (Thompson, E.P., p. 308)
Apesar de relatos como estes não serem novidades, a saber que a Inglaterra pós-avivamento ainda aspirava busca pelo conhecimento sobre Deus, o mais interessante aqui é observar os registros de um historiador secular neomarxista a respeito dos hábitos protestantes.

Estamos no Brasil, século XXI. Em nossas igrejas é raro que nas Escolas Bíblicas Dominicais se alfabetize alguém, assim como dificilmente algum irmão andaria quilômetros para ouvir um sermão reformado! Estamos na era moderna, do evangelho moderno!

Mas o que me não me deixar parar de refletir é avaliar que se lemos a Bíblia, não primordialmente para aprender gramática… se nossas Escolas Bíblicas não, necessariamente, alfabetiza nossas crianças, mas as ensinam sobre o caminho; e se não precisamos andar quilômetros para ouvir um bom sermão na igreja, haja vista termos acessibilidade geográfica, de transporte e/ou mídia, me surpreende a situação a qual nos encontramos.

É como se atualmente grande parte de nossas igrejas fosse analfabeta em relação ao Evangelho; nossas Escolas Bíblicas fossem irrelevantes (a saber, que em muitas igrejas elas nem existem mais), e que as pessoas hoje em dia podem até andar quilômetros e mais quilômetros, só que, não para ouvir um bom sermão, mas para receber alguma cura, milagre ou benção material.

Reler estas passagens da oba de Thompson me deu vergonha de parte da igreja contemporânea, aliás, é esta dita parte que ao receber o fermento religioso e mercadológico inchou a ponto de tornar-se uma ofensa ao próprio Evangelho.

Portanto, sugiro que aprendamos um pouco com os operários da Inglaterra do século XIX – conscientes, questionadores, andarilhos em busca de sermões, profissionais que faziam de seus ofícios um culto a Deus. É a prova de que a igreja brasileira pode até ter um bom currículo, mas isto não a exime de ser analfabeta biblicamente, “desconsciente”, dicotomizada, burrificada, porém alegando ter a mente do Cristo. #SQN!

***

Antognoni Misael, pós-graduando em História (UEPB), músico, editor do Arte de Chocar e Púlpito Cristão.

P.S.: Não me surpreenderá um "maluco" ler este post e sair por aí dizendo que eu sou um comunista!

Internet está afastando as pessoas da igreja, diz estudo

Pesquisa mostra que aumento do uso da rede acompanha declínio das igrejas
por Jarbas Aragão


Internet está afastando as pessoas da igreja, diz estudo
Usar a Internet pode destruir a sua fé. Essa é a conclusão de um estudo recente mostrando que a queda dramática na filiação religiosa desde 1990 estaria intimamente ligada ao aumento do uso da Internet.
Em 1990, cerca de 8% da população dos EUA não tinha filiação religiosa. Em 2010, esse percentual mais que dobrou, chegando a 18%. A diferença, cerca de 25 milhões de pessoas, indica o total de pessoas que, de alguma forma, abandonaram sua fé.
Embora o levantamento tenha sido feito apenas no EUA, levanta a questão óbvia: Por que isso aconteceu?
Temos uma resposta possível graças ao trabalho de Allen Downey, um cientista da Olin College de Engenharia da computação, com sede em Massachusetts. Ele analisou os dados detalhadamente. Sua tese é que são vários fatores, sendo o mais controverso a popularização da Internet. Downey defende que o aumento do uso da rede mundial nas últimas duas décadas causou grande impacto na filiação religiosa.
Os dados usados por Downey vem da General Social Survey, um estudo sociológico anual, promovido pela Universidade de Chicago. Desde 1972 são medidas questões demográficas e de comportamento. Além da preferência religiosa, as pessoas foram divididas por idade, nível de escolaridade, o grupo socioeconômico. As perguntas-chave dos estudos mais recentes são: “Em que religião você foi criado?” e “Quanto tempo você passa online?”
Para Downey, é inegável que o declínio na frequência aos templos depende de vários fatores. Um dos que mais chama atenção é que 25% dos entrevistados se afastou da religião em que foi criado quando no ano em que ingressou na universidade.
Na década de 1990, o uso da Internet passou a ser medido. Em 2010, 53% da população afirmava que passava duas horas por semana on-line, enquanto 25% ficava mais de 7 horas.
A correlação entre aumento do tempo na internet e diminuição na frequência aos templos é baseada na teoria das estatísticas, pois seria um elemento novo na equação que mostrou resultados significativos.
Por exemplo, é fácil imaginar que uma pessoa que foi educada em uma determinada religião possa se afastar dela, mas a proporção atual foge das tendências ao longo da história. Logo, para os estatísticos deve haver algum fator determinante.  Para os pesquisadores, nenhum elemento novo causou tanto impacto na sociedade de maneira geral nos últimos 25 anos como o uso da Internet.
“Para as pessoas que vivem em comunidades homogêneas, a Internet oferece oportunidades para se
encontrar informações sobre pessoas de outras religiões (e sem religião), e de interagir com elas no nível pessoal”, defende Downey.
Perguntado se não haveria um “fator não identificado” que tenha influenciado a desfiliação religiosa, Downey descarta essa possibilidade. “Nós temos controlado todas as tendências, desde mudanças na educação, status socioeconômico e mudanças do ambientes rural/ urbano. Nenhum deles causou tanta alteração antes”, explica.
A queda na filiação religiosa e o aumento no uso da Internet estão necessariamente ligados? Embora os resultados desta pesquisa possam ser questionados, para os pesquisadores, somente a continua análise desses dois elementos no futuro poderão comprovar definitivamente. Com informações de Technology Review

Fonte:gospelprime


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