sexta-feira, 10 de junho de 2016

Não levantarás falso testemunho

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A famosa pergunta “O que é a verdade?” feita por Pilatos refletia um ceticismo exausto em relação a própria ideia de verdade ao invés de ser uma investigação filosófica séria, como muitos propõem. Quão trágico é que um homem confiado a resolver questões de vida e morte pudesse expressar uma atitude tão cínica. E quão diferente deveria ser a atitude dos cristãos, afinal Jesus os descreve como aqueles que “são da verdade” (João 18:37).

O valor supremo da verdade é evidenciado pelo nono mandamento: “Não levantarás falso testemunho contra o teu próximo” (Ex. 20:16). O mandamento tem uma preocupação imediata com a verdade num contexto judicial. Deuteronômio 19:15-21 dá instruções sobre testemunhos num caso criminal. Uma testemunha apenas é insuficiente para estabelecer uma acusação, deve haver duas ou três (Deut. 17:6, Mat. 18:16, 2 Cor. 13:1, 1 Tim 5:19). Se há alguma dúvida em relação a integridade da testemunha, os juízes devem “investigar de forma diligente”, e se descobrem que ela é uma “falsa testemunha” (Em hebraico, eid-sheker, mesmo termo usado em Ex. 20:16), ela deve receber a mesma sentença que seria aplicada aquele que estava sendo acusado. Portanto, o perjúrio trazia consigo a possibilidade de pena de morte dentro da Lei Mosaica.

Uma das bases lógicas para a proibição do falto testemunho é que a justiça requer a verdade. Se esperamos que a justiça seja feita no Tribunal, todos os fatos relevantes ao caso devem ser feitos conhecidos, o que requer que todas as testemunhas falem “a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade”. Justiça significa que o acusado é devido a verdade, independentemente de ele ser inocente ou culpado. O oitavo e o nono mandamento estão intimamente conectados: levantar falso testemunho é uma forma de rouba, é reter de alguém algo que é seu por direito. Um princípio similar se aplica a difamação: manchar o nome de alguém inocente é como roubar algo precioso (Prov. 22:1; Ecl. 7:1).

É claro, o nono mandamento não está restringido aos tribunais. Como todo o resto das Escrituras deixa abundantemente claro, falar a verdade é um dever moral fundamental e a honestidade é uma virtude moral básica. Os justos são caracterizados pela veracidade (de fato, eles “amam a verdade” conforme Zac. 8:16,19), enquanto que os ímpios tem “lábios mentirosos” (Sl. 31:18, 120:2, Prov. 10:18, 12:22, Sl. 101:7, Prov. 12:17, Jer. 9:5, Ose. 4:1-2). Uma das maneiras pela qual amamos nosso próximo é falando a verdade (Ef. 4:15,25).

Porque falar a verdade é tão importante? Como sempre, na ética cristã, a resposta é fundamentalmente teológica. Deus é “o Deus da verdade” (Isa. 65:16). A veracidade é um atributo essencial de Deus e de Sua Palavra (Jo. 4:23-24, 14:17, 15:26, 16:13, 17:17; 2 Tim. 2:15; Tito 1:2; 1 Jo. 4:6, 5:6). Por outro lado, falar mentiras reflete o caráter de Satanás e aqueles que o seguem (Jo. 8:44; 1 Tim. 1:10; 1 Jo. 2:22; Apo. 21:8). Como fomos criados a imagem de Deus, designados a refletir sua semelhança, devemos falar a verdade da mesma forma que Deus o faz. O nono mandamento, não menos que o sexto mandamento, depende da doutrina imago Dei.

Apesar de a maioria dos Dez Mandamentos terem uma forma negativa (“Não…”), cada um deles tem uma aplicação tanto positiva quanto negativa. Guardar o nono mandamento não se trata simplesmente de uma questão de evitar declarações falsas. Como o Catecismo Menor de Westminster – Perguntas e Respostas 77 reconhece, o mandamento também requer que busquemos e promovamos ativamente a verdade em nossas relações com os outros.

Promover a verdade envolve muito mais do que apenas fazer afirmações verdadeiras, pois é possível induzir ao erro sem proferir uma única declaração falsa. Se eu fosse escrever um relatório sobre alguém, enfatizando suas falhas ao mesmo tempo que ignoro toda virtude e valor desse alguém, todas as afirmações do meu relatório seriam verdadeiras, mas tomando-o como um todo não seria algo que se encaixaria em “promover a verdade”. Promover a verdade significa dar uma representação justa e exata das coisas como elas são, mesmo quando isso vai contra os nossos próprios interesses. Da mesma forma, devemos falar a verdade com um grau adequado de precisão, não sendo vagos ou ambíguos, de tal forma que obscureceríamos a verdade por motivos de interesse próprio ou para evitar a responsabilidade de nossas palavras. Em suma, promover a verdade significa amar a verdade, não para o seu próprio bem, mas partindo de um amor sincero a Deus e ao próximo.

Em dias que a confiança em figuras públicas está cada vez mais baixa, em que os meios de comunicação não fazem diferença entre notícias e propagandas, e em que o pós-modernismo enterra o próprio conceito de verdade, é imperativo que os cristãos se separem da cultura que os envolve e que sejam distinguidos por sua honestidade, integridade e fidelidade. Devemos ser homens de palavra porque, precisamente, somos homens da Palavra de Deus.

“O que é a verdade?” é uma pergunta filosófica importante, apesar do cinismo de Pilatos. Mas uma pergunta ainda mais importante pode ser feita: “Quem é a verdade?”. O homem que permanecia diante de Pilatos já havia dado Sua resposta (Jo. 14:6). Se afirmamos conexão com Cristo, nossas relações com crentes e descrentes devem corroborar nossa confissão de fé. Só podemos testemunhar a Verdade de forma fiel se formos conhecidos por testemunhar a verdade.

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Autor: James Anderson
Fonte: Analogical Thoughts
Tradução: Erving Ximendes

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