Por Dave Harvey
Eu li recentemente que, desde 1996, países ricos perdoaram cerca de 110 bilhões de dólares em dívidas de países empobrecidos. Não simplesmente ignore essa imagem – 110 bilhões de dólares! Essa é uma quantia assombrosa de dívidas! Enquanto eu me espantava com essa imagem, outro pensamento me ocorreu. Cancelar uma dívida enorme faz uma enorme declaração.
Quando uma parte perdoa o que é devido por outra parte, isso expressa misericórdia. A misericórdia vem a nós ou flui através de nós quando uma dívida não recebida é limpa. A misericórdia significa o recomeço do relacionamento, como se a dívida jamais tivesse estado lá.
Como eu disse antes, pecadores perdoados perdoam o pecado. Se você entrar no ministério pastoral, você irá pecar e pecarão contra você. Mas é aí que está: pecar contra você pode se tornar uma oportunidade para o evangelho – um lugar para passar a outros a misericórdia que você recebeu. Se você é chamado para o ministério, você é chamado para aplicar o evangelho na face do pecado. Na verdade, o grau que nós realmente entendemos o evangelho é revelado em quão fielmente nós dispensamos misericórdia quando pecam contra nós.
Mas com o que exatamente a misericórdia se parece? Quatro coisas me vêm à mente.
Misericórdia significa que meus alvos quando você peca são mudados
A incrível misericórdia que recebi na cruz se torna o ponto de partida de como eu respondo quando outros pecam contra mim. O evangelho suprime minha raiva e meu senso de justiça. Ele me lembra diariamente de que eu recebi uma misericórdia inesgotável, e por isso devo passar adiante essa misericórdia – inesgotavelmente!
Isso significa que quando alguém peca contra mim, meus alvos são mudados. Eu não estou tentando convencê-los do pecado, porque o Espírito Santo irá fazer isso. Eu não estou tentando exigir justiça, porque a justiça foi satisfeita na cruz. Eu nunca devo condenar outros porque nunca atingiram o meu padrão, porque Cristo atingiu o padrão de Deus, a sua justiça foi imputada a eles (2Coríntios 5.21). O evangelho me liberta para perdoar quando pecam contra mim.
O evangelho me acorda todo dia com esse lembrete: eu não tive o que merecia, então não os terei como refém até que tenham o que eu acho que eles merecem. Eu posso aposentar meu policial interno que estava sempre trabalhando, procurando por crimes e fiscalizando a fim de fazer presos para o pecado. E se eu discutir pecado com você, não o farei para satisfação ou vindicação. Eu o farei para reconciliação e perdão.
Paulo diz em Colossenses 3.12-14:
Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade. Suportai-vos uns aos outros; perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós; acima de tudo isto, porém, esteja o amor, que é o vínculo da perfeição.
Porque eu recebi um perdão incrível, eu estou livre para perdoar. Pecadores perdoados perdoam o pecado. Pecadores perdoados dispensam misericórdia.
Misericórdia significa que eu não vou ver você através de seus pecados ou erros
Algumas vezes nós queremos perdoar, mas retemos o direito de suspeitar. Nós aceitamos o pedido de desculpas da pessoa, mas a recordação dela permanece. Você já percebeu que é muito mais atraente reter a recordação do que conceder perdão? É porque é difícil desistir do poder de reter recordações de erros. Queremos ter a carta mais valiosa para que, se for necessário, possamos lançar mão dela e lembrar o pecador de tudo que ele fez.
Diferente de nós, Deus não retém a recordação (Salmos 130.3). O pecado perdoado não é acoplado a um HD celestial para fácil recuperação. Deus não mantém o pecado na tabela de corretores para negociar um comportamento melhor conosco. Salmos 103.10 diz: “Não nos trata segundo os nossos pecados, nem nos retribui consoante as nossas iniquidades”.
Se é assim que Deus responde ao pecado, nós devemos responder da mesma maneira. Quando alguém peca contra mim, e então pede perdão, é uma oportunidade não somente para declarar o meu, mas também o perdão de Deus. É uma oportunidade para dizer: “Deus não vê você através dos seus pecados e erros, e eu também não irei. Deus não mantém uma recordação dos seus erros, e eu também não o farei!”.
É muito mais do que simples bondade. É um perdão que custa caro.
A misericórdia que eu recebi de Deus me capacita a passá-la a você. Pecadores perdoados perdoam o pecado, e pecadores perdoados dispensam misericórdia.
Misericórdia significa que eu aceitarei sua confissão pelo valor que ela possui
É improvável que eu serei capaz de perdoar se eu esperar até que o pecador “realmente entenda”, e então volte a mim com uma confissão mais profunda e mais sincera. A realidade é: o perdão não é uma reação à confissão. Ele flui de um coração misericordioso que está pronto para perdoar. Meu coração está preparado para perdoar porque eu lembro que Deus já perdoou todos os meus pecados – mesmo aqueles que ainda não foram confessados.
O chamado para perdoar não é dependente de alguém confessar o pecado. Marcos 11.25 é bem claro: “E, quando estiverdes orando, se tendes alguma cousa contra alguém, perdoai, para que vosso Pai celestial vos perdoe as vossas ofensas”. A ideia de que eu não perdoarei até que alguém se arrependa é, tipicamente, só uma forma super-espiritual de dizer “pague o que você deve!”. Lembre-se: a amargura nos cristãos e até nos líderes está sempre envolta num traje mais sofisticado e espiritual.
Pense sobre isso também: não há fundamento bíblico para julgar a sinceridade ou a humildade da confissão de uma pessoa. Quanto mais eu fizer com que o meu perdão dependa da qualidade da confissão, mais eu me distanciarei da misericórdia verdadeira. Em Lucas 17, Jesus diz que se um irmão pedir perdão sete vezes num dia, eu devo perdoar.
A misericórdia verdadeira aceita a confissão como ela for. Pecadores perdoados perdoam o pecado, e pecadores perdoados dispensam misericórdia.
Misericórdia significa que eu serei paciente com as suas quedas
Quando os pecadores se reúnem, a fraqueza se torna conhecida, padrões familiares de pecado aparecem, e a queda é colocada em plena exibição. O perigo, então, não é a ignorância do pecado, mas o cansaço corrosivo – o tipo que aparece quando eu começo a me cansar da sua queda.
João Calvino diz: “… ele [Deus] declara expressamente que não deveria haver limites para o perdão; porque ele nunca intentou estabelecer um número fixo, mas ao invés disso, nos intima a nunca nos cansarmos”.
Você está cansado dos pecados de alguém? Eu tenho que ponderar se esse cansaço contribuiu para a atitude do credor incompassivo. Ele simplesmente se cansou de haver alguém em débito para com ele. Então ele, como um autor coloca: “… se esqueceu do que deveria lembrar (que ele havia sido perdoado de uma grande dívida) e lembrou do que deveria esquecer (que alguém tinha uma dívida menor para com ele)”.
O chamado aqui não é para engolir tudo e simplesmente aguentar que as pessoas pequem contra você. A resposta é retornar ao débito que foi perdoado. A resposta é ser recém-inspirado pela paciência, longanimidade e bondade de Deus, e então ir e fazer o mesmo aos outros.
Conclusão
Países ricos perdoaram 110 bilhões de dólares em dívidas de países mais pobres, e essa é uma dívida extraordinária que foi perdoada. Mas como um pecador, eu fui perdoado de uma dívida muito maior! Todos os meus pecados foram pagos por Jesus Cristo. É incrível, mas a dívida que eu tinha para com Deus foi paga pelo próprio Deus.
O ministério é um chamado para ser misericordioso. Mas não é porque somos pastores ou chamados para sermos pastores. É porque somos pecadores perdoados, e pecadores perdoados dispensam misericórdia, o que é só outra forma de dizer que pecadores perdoados perdoam o pecado.
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Traduzido por João Pedro Cavani.Ministério Fiel. MinisterioFiel.com.br. Via Voltemos ao Evangelho
Original: Considerações sobre a misericórdia no ministério pastoral
Original: Considerações sobre a misericórdia no ministério pastoral
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